Nei Duclós
O amor não fala nem se cala. Ele é, como uma estrela. Vai dizer que não brilha?
Que adianta anunciar-se, Arcanjo de neón em letreiro de subúrbio? Os carros voam sobre a luz azul que some no crepúsculo.
O amor não precisa de mentiras. Nem do que pensamos ser verdade. Seja duro. O carinho se impõe quando o fogo é firme.
Ninguém fala com todas as letras porque o alfabeto está sob suspeita.
Pediste carona para alguém perdido no Tempo. O carro parou e subiste. Era o Futuro, jeitão de boa praça, aventureiro bruxo.
A beleza se desmancha. O que fica é o nosso acervo.
Fui no quintal do poema. Escassa colheita. Alguns versos de amor e tua presença, jogada no nevoeiro.
Talvez eu esteja sofrendo uma síndrome de ausências. A falta que me faz tua cintura grudada naturalmente.
Apareces subitamente. Mas me matas devagarinho. Recolha os pedaços, malvada.
Nada cola em tua lembrança. Apenas suspiros, do vento. E os gemidos, rebentos de noites longas.
Plantei poesia em tua boca. Recitas encantando os pássaros. Canções despertam do exílio.
Me afastei para te ver um pouco mais de longe, como fazemos nas
galerias de arte. Torço a cabeça como um especialista. És uma pintura
que ri de mim.
Somos apenas um intervalo da Lua cheia. Não
sabemos o que fazer enquanto ela não se apronta. O pior é que nos pega
de surpresa, quando já desistimos de vê-la.
Venha. Não se esqueça dos presentes: uma rocha lunar, uma brisa praieira.
Poema denso afunda, superficial bóia. Só tua palavra quando me beija voa.
RETORNO - Imagem desta edição: Hedy Lamarr.