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19 de janeiro de 2012
VOLTA, CORAÇÃO
Nei Duclós
A baleia vai substituir todos os sites. Voltaremos ao radio amador, pombo correio, ondas curtas, galena, telégrafo e fonograma. E tambores
Com o fim da internet, voltarão os cinemas do subúrbio, passando comédias e faroestes. Consultaremos a Barsa, impressa. Jornal no breakfest
Adeus midias sociais, up-grades, ipads, ipods e ipuds. Fim das conexões, DMs e e-mails. Volta a eletrola,o hi-fi, reco-reco,bolão e azeitona
Sim, e os estafetas, os fogos de artifício e os telefones de latas amarradas com corda fina
Teremos paz enfim. Não ligaremos mais o micro antes de acordar. Não consultaresmos o e-mail até a insânia. Não perseguiremos mais o Bial
Sim, os bilhetinhos jogados pela janela, os reflexos de espelho a distãncia, os acenos com lenços brancos
Voltaremos a escrever, como Anchieta, poemas na areia para o mar e o vento apagar antes de chegarmos ao ultimo verso.
Colocaremos nossos destinos em vidros transparentes e o jogaremos na maré para avisar o futuro que não nos importamos com ele
A internet será entregue à Ambev e ao BBB. Nós ficaremos chutando lata na sarjeta e voltaremos a frequentar os drive-in
Seremos novamente frequentadores de praças e de bancos de praça e leremos à sombra de estátuas e seremos borrifados por chafarizes
Voltará a alegria do convívio, as cadeiras preguiçosas nas calçadas, a espera da passagem do satélite e a contagem de estrelas cadentes
A grande interconexão será desmascarada pois não serve para nada, só para nos conformar com a solidão, iludidos de que estamos acompanhados
E voltarão palavras como alameda, matiné, namorico, bonde. Vestiremos roupas endomingadas. Lustraremos os sapatos. Abotoaremos a camisa
Voltarão nossos pais com suas histórias maravilhosas e seremos novamente irmãos e irmãs em brigas e conluios e algazarras
E lembraremos o sentido do amor que não se confessa porque é constrangedor reconhecer que não podemos viver isolados. Ternos, emudeceremos
E o coração pulará de alegria nessas 24 horas em que ficaremos sem conexão digital. Pois teremos a chance de ver o que vem do mundo submerso
E você me dará a mão, como no sonho que tive e veremos que somos feitos de pele e não de luzes que se apagam antes das estrelas
Volta, coração, ao mundo perdido, que não fica no passado, mas nas palavras que perdemos nesse massacre que devorou nossa identidade
Sonha, coração que não consegue mais se costurar. Experimenta de novo essa sensação de estar vivo
RETORNO - 1. Série de tuits a propósito do boicote de grandes sites à nova lei contra a pirataria. 2. Imagem desta edição: obra de Eugene de Blaas.
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