8 de janeiro de 2012

VERBO NO INFINITO


Nei Duclós

Ela fala no seu tempo de verbo favorito, o infinito

Preciso confessar: vivo disso, mesmo que não exista

Escondo no canto o que canto para ti. Mas o som rompe a parede e se espalha como um arco-íris

Vai ficando longe o que me disseste, sumindo no espaço virtual da névoa. A toda hora reponho no lugar certo, na porta de entrada do coração

Não lidas bem com as palavras, me dizes. Mas quando rompes o silêncio, há um revoar de pombas em meus telhados

Agora amargo o limbo até o tempo que decidires. Não importa. Tenho um sentimento para cuidar

Pões o amor sob as asas. Lá me recolho antes de assumir novamente o vôo. Faço a ronda enquanto encaras as divindades

Estás aqui, disse ela me iluminando com seus olhos e me flagrando com o seu retrato diante dos meus

Você diz sim? Eu digo sim. Sou o eco do meu querer

Ela está entre as palavras que escolho, alinhadas para recebê-la, infinita

Te favoritei cem por cento. Te seleciono sem limites

Não sou um bom amigo. Presto mais atenção em tua beleza do que em tua alma. Eu deveria fazer um estágio na tua bondade

Estou perdido. Minha aparência devastada sugere uma luta antiga. Mas aqui dentro há uma paisagem onde pontificas, lírica

Vi de novo teu perfil de clássica formosura. Se houvessem poetas no país, serias musa. Mas só temos almas mesquinhas

Te vejo imóvel no centro de um cenário de esplendor. Belíssima e sem ser percebida. Não haverá príncipe à altura. Apenas súditos

O maior crime que se comete é esse, contra a grandeza rara entre criaturas de extrema beleza. A noção de um espírito vasto que se manifesta pela aparência

Pior é que não posso dizer o que digo. Falo então para as paredes, forradas com a tua imagem

Um dia acabarei no remorso de não ter tido você, mulher sem igual. Nem estava distraído. Foi apenas medo de não ser o que imaginei ser teu

Mas se há justiça, me escuta, antes de sumir de vez da vista. Colha essa flor selvagem, a poesia dita em muda permanência

Rodízio de versos no exercício compulsivo. Musas que se retiram para outras vidas. Ficas só na véspera de uma catástrofe

Agora sim, dizem, pois me reduzi ao pó de onde vim. Mal sabem que me insurjo todos os dias. Conto contigo para isso. És meu escudo


RETORNO – Imagem desta edição: Jeanne Moreau

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