13 de janeiro de 2012

VARANDA


Nei Duclós

Bateu a hora do espanto. Quando te imagino numa varanda, longe de mim, a ver a Lua em desperdício, pois não há meu braço em teu ombro, maravilha

Que o verão seja breve e voltes para este sítio, onde tudo está pronto para tua lida, quando me cobres com o mel que agora atiras fora em algum lugar deserto

Não te deixei ir, mas foste. Não deixarás de voltar, mas ficas. Não deixarei de te amar, e abusas. Não cansarei de esperar porque és o dia em minha flor escura

Já estão a postos, aguardando o canto que faço para ti, musa perdida. O sonho bebe o que verto em tua ausência. Não te emociono, mas fiz do meu coração um moinho

Sumiste, presença intensa. Agora o que faço com esse vácuo que coloca as velas no chão como um traste. Impossível navegar sem tua bússola

O crepúsculo se enfiou por baixo da noite como um cão ferido. E lá ficou a contar as cores que colecionou quando nos via na praça principal do nosso corpo

Estou vazio, delícia. Não tenho mais comigo o mel que me presenteias. Sou espinhos com esperança de tocar a rosa

Deveria ficar triste porque te ausentaste. Mas o amor segura as pontas de uma maneira estranha. Estou feliz porque sou teu. Mesmo que não me pertenças

Já fui pior, ficava apenas te olhando de longe. Depois me aproximei e consegui um lugar contigo. Agora te foste, mas não voltei ao que eu era. Adquiri consistência, amor

Meio atrapalhado, fui te levar um presente, mas estavas ocupada. Incrível tua vocação de deusa e eu de funcionário de um sentimento que um dia vencerá

Não sinto tua falta quando vou de novo ao parque jogar nas latas. Derrubo todas, do jeito que gostas. Elas caem, como os dias que faltam para te rever

O amor costura tudo. Recompõe a armadura, a firula. O amor tudo costura, a saúde na loucura, a lágrima na doçura, teu coração no meu. O amor é linha dura

Obtive uma cópia original de mim mesmo clicando em ti

Passei o mouse sobre o rosto da bela e vi o futuro: o corpo verde virar um fruto maduro por obra de minhas mãos sobre sua pele

Tinhas chegado, mas dormiste no banco do trem. Acordaste quando te sacudi de leve, vendo escapar do teu rosto o perfume que me matou de saudade esse tempo todo

É só isso o amor? perguntou o deserto. É tudo para quem escapa de ti, disse a fonte no oásis

Você é muito rápida, disse o vento para a chuva. Não consigo alcançar teus lábios


RETORNO – Imagem desta edição: obra de Eugene de Blaas.

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