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12 de janeiro de 2012
DESENHO
Nei Duclós
Desenhe que eu acredito, me disse. O contorno do coração, a seta cruzando o espaço, o sangue do amor sem volta.
Fique, me falou. Sentei no meio fio. A chuva tinha feito um rio na sarjeta. Veio boiando um barco de papel. Era um recado. Venha, dizia
Sinto falta, mesmo que não saiba direito o que fazer na tua volta. Começarei com rosas, quero chegar ao perfume
Vejo pouco, pela distância. Enxergo muito, pelo que sinto. Isso te anima, pelo que dizes. Não me agradeça, mostre apenas teu passaporte carimbado com meu visto
Quase foi-se o dia e nem lembrei que estavas longe. Levaste a luz contigo, memória viva. O mundo recuperou o tom cinza do tempo em que não te conhecia
Vou-me, insistiu. E virou o rosto para o lado, para não se ver chorando em meus olhos
Volta, escrevi. Mas ela não estava lendo naquele verão
Quando voltar o frio, baterá na porta. Estará sem trinco. Poderá ver então o estrago. O retrato dela na parede, única mobília no vazio da casa
O que dói mais são essas reuniões entre conhecidos, em que finges felicidade enquanto afogas teu olhar em minha direção
Perdemos a sintonia. Quando nos encontramos, falamos ao mesmo tempo antes de súbito silêncio. Até mais são as únicas palavras possíveis
Não há tristeza ou alegria, mas palavras que se encaixam em tardes mornas, caminhos que se cruzam sem destino. Há humanidade, esse enigma
Não me aconselhe, sou rastreador indígena. Falo quase nada e não escuto pessoas vindas de outras trilhas. Fique atento ao puma
Plantamos poesia num terreno além das montanhas. Numa planície de aves aflitas. Quando florescer, haverá choro nos ninhos. E arribação, aos bandos
Se você se visse com meus olhos, nunca te sentirias triste, me dizes. Te enxergo inteira, minha alegria
Existo aqui pela tua graça. Vejo o que sinto, mistério infinito
Meus olhos bóiam em ti, lagoa de sonho, e se alimentam da tua luz. Nenhuma tristeza apaga essa chama
Tão bonita que chega a doer. Nenhum analgésico perto, felizmente
Obra de arte: perfeita por ser humana
Se eu exagerar, não estranhe. Uso uma só para palavra para abraçar tantas. Amor
Me aproximo de ti, no luau deste amor que custa a começar. Brilhas intensa, como se a Lua fosse Vênus
RETORNO – Imagem desta edição: obra de Eugene de Blaas.
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