9 de agosto de 2008

A ÓBVIA COLHEITA


O Brasil fica em vigésimo no ciclismo, Diego Hypólito é eliminado de cara, a seleção de basquete perde para a Coréia na estréia, nosso nadador Tiago Pereira lidera a primeira prova o tempo todo, mas perde na última volta, atletas brasileiros ficam de fora da final da pistola de ar 10 m, judoca tcheco perde e elimina brasileiro Denílson Lourenço, derrota de judoca húngara elimina brasileira Sarah Menezes. Num efeito dominó, vamos caindo para a posição a que estamos acostumados, no chão. Por quê? Porque a super-concentração de renda levou à inanição do povo brasileiro, que não tem competitividade em nada, à falta de políticas públicas para o esporte e ao monopólio da mídia, que é infinitamente mais rica do que todas as modalidades esportivas juntas.

Como nossas empresas se mudaram quase todas para a China, não possuímos mais capital suficiente para sustentar os atletas. Geramos emprego na China, tanto consumindo o lixo que eles produzem quanto instalando nossas indústrias por lá, seduzidos pela mão-de-obra escrava da ditadura de Pequim, modelo para a ditadura brasileira. Somos o que plantamos. Mas isso não passa pelos olhos brilhantes dos jornalistas que fazem a cobertura, tão preocupados em perguntar quem vai dar o “nosso melhor” nas quadras.

Os comerciais entregam todas. Há um sobre a maratona em que os atletas param diante do espetáculo: nos dois lados da avenida onde fazem a competição, só tem agências de um banco. A presença maciça da ditadura financeira sufoca o atletismo, que deveria ser sustentado pelos impostos cobrados do setor produtivo e não pelas migalhas colhidas dos lucros exorbitantes da ciranda monetarista. O sistema perverso nos joga no tatame e somos obrigados a conviver com uma euforia sem limites, em que o presidente acha que “estamos prontos” para sediar uma Olimpíada em 2016. No Rio, naturalmente. Ué, não seria em Brasília?

Vamos imaginar a abertura das Olimpíadas no Brasil. Começa com dez mil mulatas de fio dental rebolando a celulite enquanto dez mil passistas “dizem” com o pé, fazendo aquele sorriso falso do Al Jolson, branco que interpretava negro no alvorecer do cinema falado. As coreografias obedeceriam ao princípio seja-o-que-deus-quiser, cada perna para um lado ou para cima. Fafá de Belém cantaria o Hino Nacional (“Ou-virâm, dô I-pi-rân-ga, as mar-gens plááácidas!”). Como divulgou a Monica Bergamo recentemente na sua página na Ilustrada, o bumbum brasileiro é um hit internacional (não estou inventado, saiu na Folha). Como virou paradigma do país que é o rabo do mundo teríamos , nessa abertura, uma multidão de bundas voltadas para cima com o recado explícito de “mundo, venha nos comer”.

Os fogos seriam terceirizados para uma empresa argentina, que produziria mais fumaça do que cores. A tocha olímpica seria patrocinada por algum banco e o atleta levaria o fogo envolto na logomarca do dito-cujo. O Galvão Bueno ocuparia a tribuna de honra e receberia os cumprimentos dos estadistas estrangeiros. Uma parte do estádio ruiria com o peso da multidão pobre. O eterno presidente Hugo Chávez, com aquele sorriso lombrosiono de dono de cabaré, estaria rodeado de beldades brasileiras de micro-saias. Em vez de só termos atletas brasileiros, nossa delegação abrigaria italianos, russos, venezuelanos, chineses, americanos, todos com dupla nacionalidade.

Seria um estouro. Nunca antes nesse país veríamos coisa igual.

RETORNO - Imagem de hoje: Al Jolson no filme The Jazz Singer.

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