24 de agosto de 2008

BEIJING, BEIJING, TIAU, TIAU


O problema do Brasil é a vocação para o latifúndio. Vejam os casos de Galvão Bueno, Edson Arantes do Nascimento e Bernardo Rocha de Rezende. Foi patético acompanhar a fome de ouro e glória do locutor monopolista da Globo, que resolveu narrar tudo, de sinuca de bico a porrinha. Ficou rouco de tanto querer gritar o nome do país que o alimenta. Deu com os burros nágua. As medalhas vieram de atletas marginalizados pelo enfoque obsessivo da mídia. Eu nunca tinha ouvido falar em Cesar Cielo ou Natalia Falavigna (parabéns, André, por essa vitória da família!). Quanto custa para o patrocinador um monte de jornalista sugando recursos que deveriam ir para os atletas?

É super concentração de renda: colocam tudo nos ombros da Daiane, do Hypólito, do Tiago Pereira, da Jade e acontece que acabam sucumbindo diante de tanta pressão. No lugar de espalhar recursos para que muitos possam estar competindo, resolvem concentrar tudo em meia dúzia. No lugar de minifúndio, latifúndio, o que pede Casa Grande e Senzala. Os atletas viram escravos dos narradores. Quantas vezes vemos Galvão Bueno dando ordens para o técnico e os jogadores? Ele fala no bem bom do camarote para pegar carona nos acertos e tirar da reta nos erros. É como o feitor que coloca toda culpa no escravo.

Foi só o cidadão Edson Arantes do Nascimento chegar em Pequim para perdermos tudo no futebol. Por pouco nem ficamos com o bronze no masculino e no feminino foi aquela tragédia prateada. “Se eu tivesse participado das Olimpíadas, eu traria o ouro para o Brasil”, disse Edson, esquecido que um dia foi Pelé, o rei generoso do Brasil soberano, que nos deu tantas glórias e foi colocado de lado em função dos interesses de Edson. Quando vi Edson nas arquibancadas, lembrei que foi ele o introdutor do futebol nos Estados Unidos. Sempre torceu para as americanas. O problema é que Edson quer tudo para si, não tem para ninguém.

Para começar, ele não é tricampeão do mundo. Na Copa do Chile ele saiu devido a uma contusão. Quem segurou a onda foi o Garrincha e o substituto de Pelé, o Amarildo. Na Copa da Suécia, só entrou no meio da rodada, quando a coisa tinha andado. Foi fundamental, claro, mas não pode colocar tudo nos ombros de Pelé. Copa da Suécia é mais Didi e Vavá. E nas duas copas citadas, sempre, Gilmar. Na de 70, sim, Pelé foi o maior, participou de tudo e saiu de lá coberto de honras. Mas isso não significa que deva achar que tudo foi obra dele. Não foi. A glória é do Brasil. O problema é que Pelé quer vastos latifúndios de glória. Divida, cara. Não caia na tentação de dizer que você traria o ouro olímpico. Deixe um pouco para Marta.

O tal Bernardinho transformou-se num arrogante insuportável depois que ganhou o ouro nas olimpíadas anteriores. Demitiu craque, colocou o filho no lugar, xingou todo mundo, arrotou que era ele quem mandava. Perdeu a cabeça e o título. Desestabilizou a equipe, que só chegou à final por ser ótima, não porque ele, Bernardinho, seja o único responsável por tantas vitórias. Não deixa nada para seus jogadores? Quem sabe agora ele muda o nome do seu best-seller (desculpem, não resisto), para “Transformando suor em prata?”

O mais triste foi sair com tão pouca medalha carregando tantas justificativas e choros. Não, não somos a oitava equipe de ginástica olímpica, somos o último lugar das finais dessa modalidade. Não, o bronze não nos sustenta, queremos ouro e no mínimo prata. Não, não precisamos de força mental, isso é coisa de débil mental, precisamos é de condições físicas adequadas, um país bem resolvido e alimentado. Precisamos do fim da ditadura por aqui.

As Olimpíadas de Pequim ofereceram o pior anfitrião de todas as competições. A ditadura que, faminta, é capaz de selecionar geneticamente bebês para ganhar ouro, tomou conta do quadro de medalhas para provar ao mundo sua hegemonia. Que sumiu com a vara da nossa atleta, que poderia ter vencido. Que sacaneou com o lutador cubano, que perdeu a cabeça e deu um pontapé no juiz. Que censurou a imprensa, tirou sites e blogs do ar. Que proibiu o livre andar obstruindo tudo que é passagem. Por oferecer megalópoles pobretonas poluídas e infernais como Pequim e Xangai, maquiadas como centros de um império que não existe. Por ter águas cheias de limo. Por ter substituído a cantora feinha por outra mais bonitinha na abertura. Por simular grandiloqüência de fogos de artifício virtuais.

Descobri, ou redescobri, que Pequim é Beijing. Tiau pra ti, China.

RETORNO - 1. Imagem de hoje: Natalia Falavigna, do anonimato para o pódio. 2. Ok, Cielo tinha vencido no Pan, é conhecido no ramo e pelos leitores do noticiário esportivo. Mas como é que eu, que não acompanho o noticiário sobre natação, sofri uma overdose de Tiago Pereira enquanto Cielo jamais foi citado nessa superexposição?

Nenhum comentário:

Postar um comentário