Nei Duclós
Não falo para te agradar, mas porque tua beleza ordena.
Ao descobrir tua beleza, meu olhar te inventa.
Beijo teu vestido para enfrentar o que o vento faz contigo.
Me inundas com teu beijo, água de cheiro. Faíscas acendem as
estrelas na noite imensa.
Não pense que me disperso em sopros diversos de tentações
sem pouso. Sou o penhasco onde medram os liquens molhados do teu mar, sereia.
MUSA MUDA
Não é fácil emudecer de amor quando ele está tão explícito.
Mas vai saber. Cada musa tem um jeito de criar problema.
Preciso da musa para cultivar o poema. Sem ela nada feito.
Viro poeta ferreiro, malhando metal frio em ruinas depois da tormenta.
Por isso se submeta ao doce e bruto colocar de mãos em teu
perfil de canteiro. Sou a água em tuas raízes suspeitas, as que geram pétalas
para atrair meus beijos.
Não tem jeito de mergulhar a mão em teu lago sereno. Me
reservas as gotas que salpicam quando choves sem medo
Entendo, esse amor que sentes é proibido. Preferes implicar
comigo, é a única maneira de teu sonho verter perfume.
Negas tudo do amor como se ele tivesse sete vidas, felina.
Pessoas são o acerto das versões formatadas pelo amor. Fora
disso são consideradas, de maneira errada, fatos.
Estavas distraída lendo poesia quando o pássaro do amor
bicou teu coração exposto ao sol.
ARTE
É bom o domingo. Deus está descansando antes do Apocalipse.
A arte nos mantém vivos.
A poesia é como barragem de usina. Inunda cidades antigas,
território do amor perdido.
No recital vazio eras minha única platéia. Aguardavas o fim
do show porque eu te levaria embora. Era só o que importava daquela arenga toda
Se for mal entendido, pomos de reserva num porão encardido.
Depois tacamos fogo, rindo.
Pessoas são o acerto das versões formatadas pelo amor. Fora
disso são consideradas, de maneira errada, fatos.