Nei Duclós
Fale-nos do amor, disse o aprendiz. O mestre ficou em
silêncio. Entendi, disse o aprendiz. A força do amor está no segredo.
Quando devo ter certeza do amor? perguntou o aprendiz.
Pergunte para o teu despertar de que material é feito a manhã, disse o mestre.
Quando posso saber se alguém mentiu sobre seus sentimentos?
perguntou o aprendiz. O coração não fala pela boca, disse o mestre. Mas pelo
gesto. Preste atenção no andar e no desenho riscado pelo corpo.
Não conte a ninguém para onde seu coração foi ontem à noite.
Ele se sentirá traído.
Diga que não a vê mais. Depois se despeça e volte para a
cama que ela forrou com sua pele melada.
Disfarce o amor da tua vida. Vão achá-la horrível. Preserve
sua imagem no cofre do teu sonho.
Não apresente seu amor aos desafetos, nem aos chegados. Eles
vão devorá-lo. Diga que é alguém que você conheceu na praia e depois perdeu a
pista.
Tem para viagem? perguntou o noivo. Ela só se emociona com
poesia. Tem, disse, o poeta. Leve esses que eu tinha guardado para a minha
musa.
Deus não é vinho, não precisa ser provado. A mosca não
decide nada sobre a criatura onde pousa.
A Lua é boa confidente. Ela escuta os sussurros do casal e
sonha com alguém do próximo milênio.
Levaste o poema para a tua musa. Sinal que a amas, perigoso.
O amor tem fôlego, é persistente, resiste. Mas se parte ao
primeiro arrulho ferido numa noite densa. A doçura é seu ponto fraco.
Te conhecer é um jato de luz vindo do teu rosto pleno. O
poema se recolhe diante do impacto.E avisa: cuidado!
Existires sem mim é um mistério. Onde eu estava nesse tempo
todo?
Você desiste de mim e some para sempre. Depois volta,
atraída pelo poema, minha armadilha luminosa na escuridão do tempo.
RETORNO – Imagem desta edição: Diane Kruger.