14 de abril de 2013

OZ, O RESGATE DAS VIRTUDES

Nei Duclós

Cinema é indústria estratégica, síntese de todas as outras, vitrine do país, formatadora do imaginário nacional, exportadora da imagem interna, geradora de riquezaas. Serve para definir princípios, impor percepções e versões. Não é deixado de lado em países ricos, como Estados Unidos, França, ou Inglaterra, que não descuidam dos detalhes: toda cinematografia desses países obedecem a padrões morais rígidos, mesmo que não pareçam (até o assassino profissional James Bond é um “our son of a bitch”).

Com o caos das últimas décadas, é preciso colocar as tabuas da lei no meio dos adoradores de bezerros de ouro. Por isso cada filme americano, por exemplo, é uma descida aos infernos que um herói ou prospecto de herói faz para de lá traz o pomo de ouro do sonho nacional de coesão e sobrevivência. Nenhum filme escapa disso. Nem o recente Oz: Mágico e Poderoso (2013), de Sam Raimi, que estreou no início de março no Brasil.

O mágico charlatão de parque de diversões ganha uma chance de recuperar-se diante do desafio de trazer os anos dourados de volta a um reino encantado. Por coincidência, esse reino tem seu próprio nome, Oz. Fica claro que é uma viagem interna, psicanalítica, que o desastrado conquistador barato, mentiroso e ladrão precisa empreender para que a nação, que estava dividida e sob o domínio do Mal, recupere suas virtudes. A principal virtude é a Bondade. O pai fundador morreu assassinado por uma das filhas, que ambicionava o poder e o tesouro do trono. Mas contra essa trindade de Parcas sem domínio existe a profecia, a de que um mágico viria para expulsar a Maldade e recuperar as virtudes originais.

Quem está próximo do bobalhão sabe que ele não é de nada, mas é a única chance que possuem. Empurrado assim para uma situação terminal, e louco para meter a mão no tesouro do reino, o falso mágico vai atrás da bruxa má para quebrar-lhe a varinha de condão, ou seja, acabar com seu poder sobre tudo e todos. Mas descobre que a mulher que deve matar é a fada boa e ele estava sendo manipulado por duas irmãs malvadas. A boazinha domina o último reduto intacto do reino, protegido por uma bolha impenetrável. Mas a chegada de Oz, confirmando que tudo iria mudar, desencadeia o conflito.

Os americanos trabalham na indústria do espetáculo o tempo todo. Vemos nos filmes os discursos domésticos para todas as ocasiões. Tudo é celebrado, saudado, homenageado. A vida é um filme, um teatro, um clipe e cada cidadão é um protagonista com persona com falas. Nesse nicho de espetáculo permanente, OZ, que é do ramo, enfrenta a maldade por meio de um truque da percepção. Usa o ilusionismo, alimentado pelas descobertas científicas (Thomas Edison é o grande herói do anti-herói)para se impor às bruxas que querem exterminá-lo e assim desmoralizar o mito nacional.

A luta vitoriosa traz seus presentes: a amizade, a solidariedade, a alegria, a auto-estima, a família e o amor permanente, o que gera prole e descendência.  É assim que a nação sobrevive: recuperando o cidadão perdido para um papel extremo, que traz na sua luta vitoriosa as virtudes que tinham sido eliminadas junto com o pai fundador, que é a origem nacional.

Americano não brinca em serviço. Não veio ao mundo a passeio. Oz, como todos os filmes, é sobre cinema: começava no clássico preto e branco e termina no espetáculo a cores. Foca na capacidade de iludir com imagens e sua narrativa com lição de moral. O trecho do filme em preto e branco é o mundo condenado da realidade. O que vale é a imaginação, o sonho, o espetáculo: é nessa arena que se define a luta desigual. Mas a mágica tradicional perde importância para a mágica promovida pela ciência. No fundo, a lógica se sobrepõe como força maior.

O elenco é ótimo: James Franco está à vontade no papel do canalha ambicioso que acaba virando bonzinho, Michelle Williams é um talento somado à beleza e Rachel Weisz e Mila Kunis, sofridas como bruxas más, conseguem convencer com suas performances. A história, baseada na obra de L. Frank Baum , que já nos deu o grande clássico de 1939, se presta aqui a uma excelente narrativa, cheia de efeitos especiais encantadores. Nada de excessos cansativos. Belo filme.