- Miguel, o que pega em Kant? Por que ele é importante?
As conversas com meu filho filósofo eram sempre uma
revelação. Ele pacientemente me explicava, para eu esquecer a maior parte
depois. O que me dava o mote para a mesma pergunta no dia seguinte:
-O que disse mesmo o Kant?
Ele ria e dava nova aula. Paciente, generoso, Miguel sabia
da dificuldade de navegar no conhecimento mais árduo e sabia que, para quem não
é familiarizado com o estudo filosófico é comum boiar sempre apesar de ouvirmos
a todo momento esses nomes de pensadores ilustres. Na sua biblioteca, estão
lado a lado os grandes mestres da Filosofia e da Literatura. E das Ciências
Humanas em geral.
No texto a seguir, uma síntese do que ele entendeu de Kant.
Para que possamos manter viva as conversas inesquecíveis com ele, o convívio
com o melhor de todos nós.
http://www.consciencia.org/kantpolitica.shtml
“ASPECTOS DA FILOSOFIA MORAL E POLÍTICA DE KANT”
MIGUEL DUCLÓS
"Esse texto se propõe a analisar a seguinte frase de
Kant: "São injustas todas as acções que se referem ao direito de outros
homens, cujas máximas não se harmonizem com a publicidade",
relacionando-as com aspectos de sua filosofia política e moral.
Esta proposição é a fórmula transcedental do direito
público, presente no segundo apêndice do Tratado da Paz Perpétua, intitulado
"Da Harmonia da Política com a Moral Segundo o Conceito Transcedental no
Direito Público". Nestes apêndices, Kant está fundamentalmente preocupado
em analisar a política, o direito e a moral em suas compatibilidades.
Para Kant, o fim último da humanidade é alcançar a constituição
política perfeita. Esta disposição original avança, ainda que de forma lenta.
Pode-se percebê-la se mudarmos a perspectiva da observação histórica. Isto a
natureza ordenou desde o início, e a natureza ordena somente uma vez, sendo
sempre obedecida, mesmo à revelia das vontades individuais. A História
fragmentada, vista pela perspectiva individual e pelas idiossicrasias
particulares, mostra uma trajetória irregular, cheia de erros e absurdos, mas o
historiador filósofo, como propõe Kant, pode procurar a perspectiva da espécie
e extrair as diretrizes comuns que norteiam povos diferentes em épocas
diferentes. É inclusive dever que se impõem ao homem, quando se torna
consciente disso, proceder da melhor maneira para que essa finalidade
inevitável se desdobre o quando antes e da melhor maneira.
O cumprimento dessa finalidade é a realização das
disposições racionais da humanidade na espécie, já que no indivíduo a razão não
pode se desenvolver totalmente, conforme postula a segunda proposição da Idéia
de uma História Universal de um ponto de vista Cosmopolita, onde este tema é
tratado.
A constituição política perfeita seria a garantia da
supressão da guerra e o estabelecimento da paz por tempos incontáveis. Seria a
garantia de realização da racionalidade humana em sua mais elevada forma, a
única maneira que o homem civil teria de se situar no mundo depois de ter sido
arrancado do seio da natureza, pelo pacto social. A natureza, no curso dessa
ação traçada segundo um plano, procede por misteriosos e minuciosos meios. A
própria guerra pode ter sido um meio de servir a esse propósito, o futuro de
paz. Foi a guerra, aponta Kant, que levou os homens a se espalharem pelo globo.
No entanto, mesmo nos mais longínquos e inóspitos pontos do planeta, o homem
encontrou meios para subsistir e multiplicar. Nas regiões geladas, por exemplo,
a natureza proveu o homem da pele e gordura dos animais para vestimenta e fogo.
Levou madeiras através dos rios para a construção de jangadas e forneceu outros
meios de colonização.
A posição de Kant em relação a povos não-europeus é bastante
interessante. Como afirma em Idéia de uma História universal. Embora não
considere, seguindo a opinião de Hume, que os negros sejam capazes de grandes
feitos culturais ou cientifícos, adota uma postura arrojada ao admitir que a
"colonização" das "terras selvagens" foi recheada de
crueldades e injustiças, pois o europeu, quando lá chegou, considerou tais
terras sem dono, tendo portanto o legítimo direito de posse. Kant reconhece o direito
sobre a terra desses povos. Os indígenas na América do Norte, teriam, para
Kant, um grande potencial. Bastaria apenas o surgimento de um grande
legislador, como foi Licurgo, para poderem estabelecer a gigantesca maquinaria
política do Estado, erigindo assim uma república espartana no Novo Mundo. Estes
"selvagens" apresentariam atributos como honra, sinceridade, amizade,
liberdade e coragem, sendo carentes do sentido da beleza moral e do perdão
generoso que a civilização cristã pretende para si.
A civilização chinesa é também apreciada em sua própria
dimensão, já que Kant censura as missões ocidentais que lá queriam se
estabelecer e elogia a xenofobia chinesa que impunha severas restrições no
contato com os povos estrangeiros. Kant enxerga, também, uma origem comum a todos
povos. Depois de tecer alguns brilhantes e eruditos comentários sobre a
designação pela palavra China dessa imensa região, elabora a hipótese de que os
povos só foram para regiões como o Tibete depois de terem sido expulsos de um
lugar primevo pela guerra provocada pela escassez de recursos e pela ausência
do estado civil. Também os esquimós seriam, talvez, os primeiros colonizadores,
que possibilitaram a invasão da América numa época imemorial.
Esta consideração, ainda que limitada, pela diversidade dos povos,
numa época em que o eurocentrismo exisitia com força plena, é bem demonstrada
nos artigos II e III da Primeira Seção do Tratado da Paz Perpétua: os Estados
devem ser considerados em sua soberania. A não-obediência a esse princípio
acarreta risco para a própria causa da existência dos estados: a livre
associação dos indivíduos segundo o contrato originário.
O Estado não pode perder seu caráter moral, sendo
transformado em coisa, assim como a mobilização da população para fins
desnecessários é caracterizada como abuso do soberano em relação aos súditos. A
imiscuição de um Estado noutro é uma ingerência, pois cada Estado tem sua raiz
no próprio tronco e tem o direito, como independente, de combater suas
enfermidades.
Os cidadãos convocados para o Exército por uma potência
invasora estão extrapolando seu dever como parte do soberano. Kant é contrário
à existência de exércitos profissionais e permantentes, defendendo a associação
militar voluntárias dos cidadãos somente nos momentos de crise. Isso é mostrado
na Proposição 3, "Os exércitos permanentes (miles perpetum) devem, com o
tempo, desaparecer totalmente" : "pôr-se a soldo para matar ou ser
morto parece implicar em uso dos homens como simples máquinas e instrumentos
nas mãos de outrem (do Estado), uso que não se pode harmonizar bem com o
direito da humanidade na nossa própria pessoa. Uma coisa inteiramente diferente
é defender-se e defender a pátria dos ataques do exterior com o exercício
militar voluntário dos cidadãos realizados periodicamente."
Esta preocupação com os limites do Estado em relação aos
seus súditos é demonstrada também pelo autor em sua relação com a política da
época, e não somente na sua teoria. No Conflito das faculdades, Kant denuncia
severamente a manipulação do povo empreendida pelo Estado através dos esforços
das faculdades ditas superiores: a teológica, a de direito, e a de medicina.
A maneira vertical com que propagam suas doutrinas não
deixava espaço para o debate desinteressado que busca apenas a verdade. Este
papel ficaria a cargo da faculdade inferior de filosofia, segundo a estrutura
da universidade alemã setecentista. Os ensinamentos das Faculdades Superiores
emanariam de um princípio também superior, e não da simples razão.
Especialmente a Faculdade Teológica, que tem como cânon a Bíblia, não pode
estar aberta ao questionamento. Não cabe ao teólogo julgar o valor de verdade
do dogma, apenas reproduzi-lo. Mas Kant considera que é da alçada da
investigação filosófica as doutrinas religiosas, em seus diversos assuntos, até
onde se possa estabelecer um limite seguro do conhecimento segundo a razão.
Para ilustrar melhor esse complicado preceito, Kant elabora uma engenhosa
imagem no prefácio de A religião nos Limites da Simples Razão: A teologia e a
filosofia seriam como dois círculos concêntricos, englobados um no outro, sendo
a fé o círculo maior. Porém a filosofia teria os seus limites mais bem
delimitados, pois, através do rigor racional da investigação, poderia saber
onde termina o conhecimento – ainda que especulativo – e começa o recurso da
fé, terreno lodoso. Haveria até mesmo consonância de resultados na Faculdade de
Filosofia com a de Teologia no tocante à moral, no aspecto prático dos
preceitos de dever e de conduta. Este seria, para Kant, o verdadeiro motivo da
longevidade do cristianismo, e não sua erudição histórica. Tanto o imperativo
categórico como a moral religiosa são absolutos. A diferença é que a última
fundamenta sua autoridade no julgamento das almas por Deus e o imperativo
coloca seu princípio em si mesmo.
Dissemos que a filosofia pode se intrometer nos assuntos
religiosos. O teólogo, porém, segundo a peculariedade de sua faculdade, não
deve se intrometer no campo da filosofia, sob o risco de recair numa
"anarquia", na falta de paradigmas proporcionados pela Revelação e
Graça Divina. Existem alguns teóricos, porém, que aceitam e vivificam a
discussão, como o amigo de Kant, Stäudlin, a quem o Conflito é dedicado, e a
pedido de quem Kant havia escrito, originalmente, a primeira dissertação sobre
o conflito com a Faculdade de Teologia. Sobre essa revelação Kant formula mais
uma imagem, que aparece pelo menos duas vezes: A faculdade filosófica seria a
serva da teológica, resta saber se adiante iluminando o caminho com uma tocha
ou atrás carregando a cauda do vestido majestoso.
Falavámos do uso arbitrário que o governo fazia das três
faculdades superiores para atingir o seu fim, que é a influência sobre o povo.
Kant observa a seguinte ordem na influência que corresponde à ordem das
faculdades: "em primeiro lugar, o bem eterno de cada um; em seguida, o bem
civil como membro da sociedade; por fim o obem corporal (viver longamente e ter
saúde). Mediante as doutrinas públicas em relação ao primeiro, o próprio
governo pode ter a máxima influência sobre o íntimo dos pensamentos e os mais
recônditos desígnios das vontades de seus súditos, a fim de descobrir aqueles e
dirigir estes; graças às que se referem ao segundo, pode manter o seu
comportamento externo sob o freio das leis públicas; por meio do terceiro,
assegurar a existência de um povo forte e numeroso que achará utilizável para
seus propósitos." Vê-se que as faculdades superiores, os profissionais e
funcionários que elas formam tem uma atividade não acumulativa e progressiva,
no tocante à sua ciência, mas somente acumulativa, reprodutora de medidas
sancionadas.
Para a Faculdade Filosófica Kant defendia a
não-interferência do Estado, que deveria a ela conceder a liberdade de formular
suas doutrinas e julgar o valor de verdade dos outros ramos do saber. Numa nota
bastante esclarecedora da Introdução do Conflito, a nota 5, Kant faz uma
analogia entre a fala de um comerciante ao ministro que queria melhorar o
comércio, e a maneira liberal com que o governo deveria brindar a faculdade de
filosofia: "Criai boas estradas, cunhai boa moeda, institui um pronto
direito cambial e coisas semelhantes. Quanto ao mais, porém, <>". O
governo não tem competência para poder tratar de todos os assuntos, assim sua
intromissão se tornaria nociva. Nesse ponto, a Faculdade de Medicina se assemelharia
à de Filosofia: Já que o governo não pode julgar os assuntos técnicos da
medicina, limitava-se a sancioná-los e a cuidar da política pública de saúde em
aspectos extrínsecos.
Vê-se que o que está em jogo é uma crítica ao Estado
paternalista, o Estado Eudemonístico, que procura orientar os súditos para a
"felicidade". Norberto Bobbio observa que enquanto o Estado Natural
foi chamado de protetor, o Eudemonístico foi chamado de paterno. O estado
protetor se limita à ordem externa, não se intrometendo nos assuntos internos
de seus protegidos. Já o estado paternalista julga-se no dever de cuidar da
saúde moral, material e espiritual de seus súditos. Nesse ponto Kant estava
muito distante de defender o rei-pai absolutista, aproximando-se de Locke, que após
refutar o absolutismo de Filmer, defende um poder régio diferente do poder dos
pais sobre os filhos. (BOBBIO, Direito e Estado no Pensamento Político de
Immanuel Kant, pg 136 e seguintes).
Um pouco decepcionante, portanto, é a postura do povo que
aceita o jugo e até parece satisfeito com ele. Kant comenta laconicamente que o
povo tem propensão para o gozo e aversão a corrigir-se ou admitir-se errado. Na
seção II do Conflito, num diálogo imaginário entre o povo e o filósofo, há um
questionamento se todo esse palavreado teórico da filosofia adiantaria alguma
coisa se houvesse julgamento das almas no céu, ou se houvesse um processo
jurídico que o cidadão precisasse ganhar, ou para manter o corpo são.
O desdém do povo pela filosofia deve-se a dois fatores: a
falta de aplicabilidade da teoria – pois tanto estudo não chegaria a conclusões
muitos diversas do senso comum, e a grande expectativa em relação ao sábio e ao
erudito – a quem o povo se aproxima como a um adivinho ou mago portador de
poderes sobrenaturais.
Apesar de o Iluminismo ser uma das três épocas em que a
filosofia mais se aproxima da sociedade, (os outros dois seriam o ensino
público de retórica na Grécia Antiga e a Filosofia Política do XIX e XX,
comunismo, anarquismo etc) temos aqui a repetição de um tema muito nosso
conhecido: o desprezo e preconceito de vulgo em relação ao abstrato, e
consegüinte, a condenação da filosofia. Como na Alegoria da Caverna de Platão,
o povo não aceita que lhe mostrem a verdade de sua condição de ignorância e escravidão,
preferindo uma falsa felicidade em nome da comodidade à liberdade e consciência
do sublime e grandioso, que certamente dá e exige mais dedicação e
entendimento.
Este é o papel de tutelado que Kant atribui ao povo e que se
assemelha a um homem em sua menoridade. Deleuze observa logo no início de Para
Ler Kant, que o homem sai da menoridade do ponto de vista da natureza quando se
torna capaz de procriar, e do ponto de vista da sociedade quando se torna capaz
de se sustentar. Para Kant, a saída do homem da menoridade estaria
intrinsicamente ligada ao processo de esclarecimento (Aufklärung). Sapere
Aude!, encoraja o filósofo. Ousar saber é o pré-requisito para o homem se
situar no mundo. Tudo o que nunca foi usado é débil, mas não se deve desisitir
de usar o entendimento ainda que se leve alguns tombos no início desse
processo. Pois, o financista faz as minhas contas, o médico se ocupa de minha
saúde, o padre de minha alma. Sou levado a repassar meu direito inalienável da
liberdade de pensamento para "especialistas" à minha volta, sendo
assim incapaz de caminhar por passos próprios. Apenas a preguiça e a covardia
podem levar a querer me manter nesta situação miserável. Ou seja, o homem é
responsável pela sua própria ignorância. (KANT, O Que é o esclarecimento?)
O processo de esclarecimento exige o direito do uso público
da razão para poder se consolidar. Kant admite que sua época ainda não é
esclarecida, mas, otimisticamente, situa o Esclarecimento no futuro, talvez
como precedente da constituição perfeita que sua Filosofia da História anuncia.
Mas há bons motivos para Kant se mostrar otimista em relação
ao avanço deste objetivo: estamos na época Iluminista, na confiança do poder da
luz natural da razão, no afastamento das superstições e das trevas, no propósito
de tudo esclarecer através da ciência. Rubes Rodrigues Torres Filhos observa no
ensaio "Respondendo à pergunta; Quem é a ilustração", invocando o
Prefácio da Crítica da razão Pura, que furtar-se à luz é querer se esconder. O
projeto rigoroso kantiano propõem que tudo deve se submeter à análise crítica.
Essa é a única capaz de estabelecer os limites seguros da ciência e estruturar
sistematicamente o conhecimento adquirido. A própria Crítica da Razão Pura já
se atribui esse caráter inaugurador, pioneiro. Kant considera que seu trabalho,
apesar de monumental, é preliminar, propedêutico. Conclama o leitor à dar
continuidades no tratamento de hipóteses que são apenas levantadas em sua obra
e lamenta o avanço dos seus anos.
O momento da publicação do Ensaio O que é Esclarecimento é
certamente mais ameno e favorável que o do posterior Conflito das Faculdades
(1797). Neste, estamos sob o governo do rei Frederico Guilherme II, que havia
publicado dois editos de censura sobre religião e admoestado Kant por meio de
seu censor, Wöllmer, por ocasião da repercussão de seu livro A religião nos
Limites da Simples Razão. Tal livro, aliás, havia sido bem recebido, mesmo
entre teólogos (liberais, como Stäudlin) e estava provocando um saudável debate
entre professores. Vemos Kant, no prefácio à Segunda Edição do livro, rebater
algumas críticas feitas à sua obra, mas agradecido e aquecido com o interesse
dos convivas eruditos em sua correspondência. Assim, o seu enquadramento no
edito de censura e a funesta ameaça real de conseqüências desagradáveis foi um
duro golpe, que representou, senão em uma perda de otimismo quanto à esperança
de esclarecimento, pelo menor uma maior prudência e cuidado com as palavras. Na
sua justificação escrupulosa ao rei, Kant retira o debate abordado em se livro
do âmbito público para caracterizá-lo como "uma disputa entre eruditos da
faculdade, da qual o povo nada sabe". O austero professor, entretanto,
sobreviveu à promessa de não escrever mais sobre religião enquanto súdito de
Frederico Guilherme II, que morreu pouco depois, ainda jovem.
O que é esclarecimento, entretanto é escrito durante o
reinado de Frederico II, o Grande, que passou à história como um rei
iluminista, déspota esclarecido, incentivador e patrono de vários filósofos,
correpondente de Voltaire. Em seu reino a Prússia pode farejar o vento
auspicioso do Esclarecimento.
O principal problema do estado de natureza é a ausência de
um legislador imparcial que faça valer o direito. Para que exista a propriedade
é necessário também que haja a vigência de um estado de direito com poder
coercitivo. Ricardo Terra observa que, para que haja a propriedade privada, é
necessária que haja a propriedade suprema. Mas o soberano, enquanto
personificação do Estado e representação da Vontade Geral, não pode ter
propriedade sem que se torne um particular. Isso acarretaria também em risco de
conflito. Supondo uma situação de disputa de propriedade entre um soberano e
seu vizinho, este poderia usar sua autoridade para garantir parcialidade da
justiça, acabando assim com a característica fundamental do estado de direito:
a justiça competente para resolver questões sobre indivíduos de forma alheia. O
soberano, assim, possui tudo sem nada possuir. (TERRA, A política tensa, pg 52
e seguintes)
A melhor maneira de governo, para Kant, é a republicana. No
Primeiro Artigo Definitivo para Paz Perpétua, Kant coloca a constituição
republicana como a única em consonância com o princípio de liberdade, com o
princípio de todos obedecerem uma legislação comum, e com a lei da igualdade
dos súditos enquanto cidadãos.
Kant estabelece uma distinção entre forma de soberania e
forma de governo. A primeira diz respeito ao número de pessoas que detém o
poder. Seria a aristocracia, a autarquia e a democracia. A segunda diz respeito
à maneira pela qual o poder é exercido, podendo ser republicano ou despótico.
Na forma republicana, o Executivo está seprado do Legislativo, o governo
obedece às leis promulgadas pelo soberano, que devem estar de acordo com a
Vontade Geral. Há aqui o importante conceito de representação, que dá margem à
caracterização da democracia como despotismo.
Os estados republicanos, na federação proposta na Paz
Perpétua são os mais aptos a manter as relações leais necessárias . Sem essa
Federação os Estados estariam como que em um segundo estado de natureza, uma
vez que em relação uns aos outros, não há poder comum capaz de legislar para
todos imparcialmente. Tal constituição exigiria uma conduta extremamente ética
por parte do estadista, a ponmto de Kant comentar que seria necessário um
"exército de anjos" para mantê-la.
Vimos então como o filósofo Kant estendeu sua teoria de
Königsberg para o mundo, buscando sempre, na idealidade da teoria política,
moral e jurídica, o caráter necessário de suas proposições, mesmo que elas só
encontrem em estado de potência, e a germinação das sementes da universalidade
encontrem, inevitavelmente florescimento no futuro. Para sustentar essa
necessidade o filósofo procurou sempre demonstrá-las, de maneira racional e
razoável, sem recorrer a princípios de autoridades externos e sem se furtar ao
debate.”
Miguel Lobato Duclós (1978-2015), leia no link
http://www.consciencia.org/kantpolitica.shtml
BIBLIOGRAFIA
1.Bobbio, Norberto. Direito e Estado no Pensamento Político
de Immanuel Kant. Editora da UnB.
2. Filho, Rubens Rodrigues Torres Ensaios de Filosofia
Ilustrada. Editora Brasiliense, São Paulo, 1987.
3. Kant, Immanuel. Textos Seletos. Editora Vozes, 1984.
4. _____________, Conflito das Faculdades. Tradução de Artur
Morão. Edições 70, Lisboa.
5. _____________, A religião nos limites da simples razão.
Edições 70, Lisboa.
6. _____________, Idéia de uma História Universal de um
ponto de vista cosmopolita, org. ricardo terra. Brasiliense, 1986
7. ______________, Tratado da Paz Perpétua, Edições 70,
Lisboa..
8. Terra, Ricardo. A política tensa. Iluminuras, 2001.
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