Nei Duclós
Alfonso
Cuarón filma o que não faz parte do cinema, o que está no fim ou fora das
sessões vespertinas dos anos 70 num bairro da cidade do México, Roma, que dá
título ao seu novo lançamento, disponível na Netflix. O que não existe nos
filmes clássicos vistos por casais pobres, mas existe nas rotinas domésticas de
crianças e mulheres de uma casa de classe média, é o que ocupa o cineasta de
Gravity, seu grande sucesso que nasceu do impacto sobre ele, criança, de 2001,
de Kubrick. Ele reproduz uma cena de 2001 – a do astronauta que sai da nave para
resgatar o colega morto pelo supercomputador Hal – mas com atores mexicanos. É
a forma de dizer que o cinema vem de fora e impacto o interior de cada um e se
refaz é adaptado ao mundo pessoal.
Cuarón filma
pequenas tragédias das mulheres, a gravidez indesejada, a separação brutal, o
stress de momentos terminais. Especialmente quando a empregada doméstica vai
falar com o pai da criança que ela carrega ainda no ventre e este o agride com
sua fúria de filme de Bruce Lee. O mesmo sujeito estúpido faz parte da polícia
e participa do massacre de estudantes insurgentes.
Cuarón filma
a rotina doméstica das empregadas, da dona da casa, do marido, da avó, das
crianças, todos reunidos em torno de programas humorísticos de TV, que é uma
representação do que o cinema também não mostrava, pois a televisão na época
era marginal á Sétima Arte. O filme, em clássico preto e branco, é um achado
cinematográfico desse grande diretor, que enfrenta o desafio de filmar o que o
cinema omite e nos revela a grandeza das imagens aparentemente banais, mas que
estão plenas de heroísmo, amor, esperança, luta e dor.
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