A longa (4
temporadas e 40 episódios na Netflix) e interminável série (anunciam mais uma
temporada) The Affair é um pacote dramático sobre tragédias familiares
embalsamadas como um convite à permissividade (as mais ardentes cenas de sexo
explícito). Criada por Hagai Levi e Sarah Treem, tem boas performances de
Dominic West, como o atarantado escritor de sucesso, Ruth Wilson, como a rica
esposa traída e a bela Maura Tierney, a garçonete que seve de estopim para o
rolo todo.
Famílias são
destruídas, desejos punidos, sonhos desfeitos, com a morte rondando os
personagens e os diálogos à luz da moderna psicanálise tentando colocar ordem
na bagunça, mas quem vence é a tradição (trair é pecado), e quem perde são os
filhos, esbagaçados pela separação e vítimas do descaso e irresponsabilidade
dos pais. Há um esforço de todos assumirem suas culpas e se esclarecerem sobre
onde fracassaram, o que faz os relacionamentos serem meros coadjuvantes de algo
maior, a necessidade de existir um mínimo de ordem no caos provocado pelas
aventuras amorosas.
Trata-se de
uma elite originada no comércio e nos serviços – escritores, donos de lojas,
cirurgiões, especuladores financeiros, corretagem – e não na indústria. O nível
econômico é alto e deveria facilitar os andamentos, mas tudo se complica nesta
anti-comedia romântica, em que parece denunciar a velha cisma do cinema
americano com o sexo – lembram-se das camas separadas dos casais na época da censura?
ou das tragédias que se sucedem imediatamente a um ato sexual. evento
recorrente no cinema gringo?
Talvez seja
esse o involuntário objetivo da série, muito bem feita e fonte de ansiedade em
todos os episódios (sempre há uma situação constrangedora): o de manter a
punição à permissividade, mesmo com todas as liberdades permitidas pelos novos
tempos. No balanço final, fica a impressão de que nada mudou, a não ser a
profundidade maior do medo, da depressão e da infelicidade, agora explícitas,
libertas de toda censura.
A série é
também um passeio pelos Estados Unidos, com detalhes geográficos e de
comportamento bem focados numa produção esmerada, rica e que ganhou dois globos
de ouro, um para cada uma das atrizes principais. A performance dos atores e atrizes
é em geral boa, mas mediana, apesar da boa concentração e do aspecto
convincente que dão aos seus papéis. Quem se destaca é Maura Tierney, doce e
trágica, interpretando a mulher que perde um filho, tenta consertar sua vida
com um homem casado e acaba sucumbindo ao entorno doentio da nação envolvida em
guerras pelo mundo todo e com riquezas em excesso para tanta precariedade
humana.
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