Nei Duclós
Tenho outro por dentro, minha reserva, que também te ama.
Todo verso tem a tua imagem. Não coloco para não dar
bandeira. Mas onde se lê doçura, se vê teu beijo.
Levaste cópia para o encontro: o meu poema. Quando começaste
a recitar, ela completou. Já tinha lido nos teus olhos.
A poesia não existe sem tua beleza. As palavras travam se
ficas de fora. Mas não sou bela, dizes. O poema discorda.
Me chama do que eu faço, não do que eu te faço. Mistura
toque com ofício. Não sou adjetivo, substantiva.
Fadinha, disse ele. Não tenha receio, não quebro, disse ela.
Amor, devagarinha, quase imperceptível, não fosse a sombra
que faz tua doçura.
Teus passos ressoam em mim, deslizando sobre o que sobrou
das nossas tardes.
Já te arrastei porque consentiste. Agora pedes que eu
repita. Estou com força, sou capaz de cometer um desatino. Tens fome, delícia.
Te escondes nessa devoção que tenta jogar água fria em quem
se aproxima. Mas basta um movimento teu, um imperceptível requebro de tua
natureza impiedosa, para que caia tua máscara e revele o escândalo da minha
vontade absurda.
Quando ela fica muito compreensiva é porque não acha
importante te compreender e passa por cima. A meta dela é outra. Só que para o
truque funcionar, ela acaba realmente te compreendendo, paspalhão.
RETORNO – Imagem desta edição: Priscila Almeida.