Nei Duclós
Vou te pegar de jeito, armadilha de desejos.
Não o deixe esperando, aceite meu beijo. Ele é alérgico ao
sereno.
Meu tato te lê em voz alta.
És minha leitura favorita. Não falo das cartas nem dos
poemas, mas da tua cintura.
Estamos num impasse. Te quero, por isso bato firme. Me
queres, por isso me ignoras. Sinuca de bico.
Cliquei em tua imagem, não respondeste. Bem feito para mim,
admirador sem pouso.
Continua magoada? Melhor deixar isso de lado. Esgotamos
nossa cota de rupturas.
Na roda do tempo, imagine meu toque de presente. Só para te
deixar passada. Coisa sem futuro, quando pedes água.
Cheguei fugido. Tiranos perseguem desertores. Decidi voltar
para ficar contigo. Não se impressione com o ferimento. Passa rápido, como a
vida.
Dei uma volta pelo sonho, estavas linda. Fiquei por lá, onde
és minha.
ELEITA
A poesia não compareceu no batente. Foi dar um tempo, pensar
em outra coisa. Aproveita o dia de agosto, solar, pleno de luz. Às vezes manda
mensagens em versos ocultos.
Já foste eleita, tens compromisso. A mim resta o olhar
comprido e a submissão até da fantasia. Espero que não venha a furo o ímpeto
que surdamente provocas, rebeldia.
Aspereza é a doçura da planície, espinho assedia a pétala,
arrulho na montaria: viver precisa do que é simples, sonho alimentado no
cruzamento de espíritos, ungidos pela carne trêmula.
A violência no trato impede que se exercite a prazerosa
diferença. O sabor, impedido de experimentar o delicioso choque entre opostos,
submerge na brutalidade.
Um baque de improviso na rotina, vindo meio de lado em pleno
começo do dia, desvia a atenção para o que interessa: a vontade que sempre tive
de você pertinha.
Por esporte, te ofereces a distância achando que não te
alcanço. Mas já estou com o pulso em teu rumo, portento.
Chega, disse ela. Eu cedo. Agora vê se não tarda.
RETORNO – Imagem desta edição: Michele Morgan.