Nei Duclós
Descobri que não
existo
me procurei nos
arquivos
nenhuma prova de vida
a certidão de batismo
número de registro
serviço, cidadania
RG, vacina, CIC
ou boletim dos
maristas
a mais pálida
biografia
nem mesmo o mínimo
risco
em moldura,
pergaminho
nenhum resto ou
resquício
rastro, pegada, pista
uma citação em livro
reportagem ou convite
blasfêmias, um
panegírico
Tudo passou em branco
na limitação do limbo
que por sua vez foi
extinto
e o nada ficou
pulsando
numa precoce demanda
que temos de
apocalipse
distância de paraíso
condenação decidida
num apagado rabisco
sem memória ou
serventia
desvivi, foi pelo
avesso
que tomei
conhecimento
pois como posso saber
de um fato tão
sinistro?
se não passei pela
terra
como sou sem ter
nascido?
Foi excesso de
carinho
me disse um anjo
metido
ganhaste tudo na
infância
prêmio por ser parido
mãe que tudo provia
pai montado no
estribo
em generosa família
com banquetes aos
domingos
Páscoa, Natal, Corpus
Christi
carnaval, caça às
perdizes
o excesso gastou cedo
o que devias ter sido
por isso nada restou
do teu perfil sem
sentido
ainda poderás ler
estas absurdas linhas
mas é só, és um
problema
sumirás, definitivo
no final deste poema
RETORNO - Imagem desta edição: obra de
Giovanni Boldini.