Nei Duclós
Quando formos embora, nossos rostos dirão ao futuro:
estávamos em rede, noturnos.
Foi quando nos conhecemos, diremos. Pelo menos, estávamos um
na porta do outro, como vizinhos.
Resgatamos infância, escrevemos memórias, construímos pontes
e por ela trafegamos, de olho no despenhadeiro
Foi uma viagem, de luz e sonho. Depois, nos perdemos. Fomos
sumindo, como as estrelas quando o sol traz a demolição do tempo
Mas ficou esse clima de algo feito. Um abraço entre sombras,
uns amores sem rumo. Coisas humanas, daquele tempo.
Quando formos embora, não seremos lembrança, mas móveis de
uma geração estranha: cadeiras de vime, luar na varanda, cidades em crise
Não teremos contato, criança de um novo cosmo. Seremos esquecidos,
mas pulsantes. Somos a borda resistente de um buraco negro.
Escute a guitarra, o batuque, a sinfônica. Seremos nós, riso
aberto numa platéia de anjos.
RETORNO - Imagem desta edição: foto de Marga Cendón