30 de setembro de 2013

QUANDO FORMOS EMBORA



Nei Duclós

Quando formos embora, nossos rostos dirão ao futuro: estávamos em rede, noturnos.

Foi quando nos conhecemos, diremos. Pelo menos, estávamos um na porta do outro, como vizinhos.

Resgatamos infância, escrevemos memórias, construímos pontes e por ela trafegamos, de olho no despenhadeiro

Foi uma viagem, de luz e sonho. Depois, nos perdemos. Fomos sumindo, como as estrelas quando o sol traz a demolição do tempo

Mas ficou esse clima de algo feito. Um abraço entre sombras, uns amores sem rumo. Coisas humanas, daquele tempo.

Quando formos embora, não seremos lembrança, mas móveis de uma geração estranha: cadeiras de vime, luar na varanda, cidades em crise

Não teremos contato, criança de um novo cosmo. Seremos esquecidos, mas pulsantes. Somos a borda resistente de um buraco negro.

Escute a guitarra, o batuque, a sinfônica. Seremos nós, riso aberto numa platéia de anjos.


RETORNO -  Imagem desta edição: foto de Marga Cendón