Nei Duclós
Revi trechos do datado Hair (1979), de Milos Forman. Filme
tardio para o que reporta, o desbunde americano na virada dos 1960. Pelos
cálculos, a profecia sobre a era de Aquário coincidiria com nossa época agora.
É de matar de rir. Ou chorar. Vivemos exatamente o oposto do que o previsto.
Uma nova conjunção de astros traria uma época de ouro para a
humanidade. Vimos no que deu. O fato é que a era de Aquário foi aquele
comportamento anunciador, aquela cultura que explodiu na época. Foi a vida
imaginada que instaurou uma nova realidade, que passou, como tudo passa. Algo
ficou em mudanças radicais, mas os efeitos colaterais são mais visíveis.
A música praticamente acabou depois que foi implodida.
Ficaram aqueles hits, hoje clássicos, enquanto prolifera a falta de talento
forjada em celebridades, apesar da sobrevivência de algumas ilhas de
criatividade. O consumo de drogas se espalhou para todos os estamentos sociais.
O lado místico, que gerou tanta coisa bonita em todas as artes, ganhou foros de
epidemia, facilitando a penetração de religiões emergentes cada vez mais
obscurantistas. Vestir-se de maneira não tradicional acabou em desleixo puro e
simples.
Como retroceder é impossível, nos resta manter a esperança
de que as coisas realmente vão mudar para melhor nas próximas gerações, quando
se esgotarem tanto os revivals do mundo caduco quanto a ilusão de que podemos
instaurar um novo tempo fundado na astrologia. Tenho visto inúmeros exemplos de
talentos precoces explodindo nas redes sociais. São intérpretes mirins que
assombram pela qualidade da voz, instrumentistas ainda na primeira infância que
deslancham em suas performances, crianças pensando coisas originais e
contundentes.
Talvez esteja surgindo uma nova geração de gênios. Que ao
chegarem à vida adulta poderão criar algo diferente do que foi imaginado ou
deixado para trás. Mas não estarei mais aqui para ver. Continuo morando naquele
lugar, na poesia feita para costurar o mundo em frangalhos e dita de forma
clara para se identificar com uma vida que nos transcenda, num exercício árduo
de véspera da eternidade..
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