7 de março de 2009

A IGREJA ERROU


A Igreja errou. Disse que a Terra era plana e jogou na fogueira quem foi contra essa idéia. Teve que pedir perdão, cinco séculos depois. Esperamos que leve menos tempo para pedir perdão pelo erro cometido ao excomungar os participantes do aborto de uma vítima de estupro, de apenas nove anos, que estava grávida de gêmeos. Errou e errou feio. Devia se fechar em copas, mas resolveu meter sua colher. O próprio arcebispo que praticou a excomunhão reconhece que há um milhão de abortos por ano no país. Por que não faz um milhão de excomunhões por ano?

A fé não pode estar apartada da razão. Os dois pilares do templo seguram a abóboda dos princípios religiosos. Assumir uma posição obscurantista, sob o pretexto de que está defendendo a vida, é de uma limitação sem fim, tanto sob o ponto de vista intelectual quanto moral. É imoral achar que o estupro é menos grave do que o aborto. O estupro é crime, o aborto, neste caso específico, é uma solução médica para erradicar a conseqüência que colocava em risco a menina. Esse episódio manchou o papado de Bento XVI, que terá de vir a público pedir perdão, revertendo a decisão.

O Papa é infalível em termos doutrinários, não infalível em si. O dogma tem a ver com a instituição, não com a realidade fora dela. Sabemos disso desde que o Pio XII abençoou as hostes fascistas. A importância do episódio da menina grávida de gêmeos é que a Igreja enfim foi colocada contra a parede num tema fundamental para o mundo. O jeitão do arcebispo é Lombroso puro. Curvado sobre sua própria ignorância e arrogância, de voz pastosa como se estivesse pregando para o gentio, deveria sentir vergonha de enlamear um médico católico, que agiu por consciência profissional e solidariedade.

Há muito mais mansidão e compreensão no médico excomungado, que prometeu continuar indo à missa, do que no arcebispo ou nas autoridades do Vaticano, envoltos em suas peles de cordeiro quando tomam o partido dos lobos. Quer dizer que o estuprador pode confessar, ser perdoado, comungar e o médico não? Com a alma limpa, lépido e lampeiro, o estuprador arrendido ascende aos céus enquanto o doutor desce às catacumbas da perdição?

Eu que sou católico, apostólico, romano, fiquei indignado com essa. Imagino o que devem sentir os adversários tradicionais da Igreja. Aliás, vi anteontem o programa do PCB, Partido Comunista Brasileiro. Correto, didático, incisivo, claro, límpido. Fiel à ideologia e seus princípios. Totalmente errado ao vilanizar o capital e endeusar o trabalho, longe de tentar algo mais certo, como o equilíbrio entre as duas forças, como propõe o trabalhismo. Erra também ao apoiar todas as ações do MST, sem relativizar, sem verificar se não está havendo criminalização mesmo em alguns setores do movimento.

Tanto a Igreja quanto o PCB estão no seu próprio caminho, mas não devem deixar que a própria radicalidade feche as portas para um mundo mais humano e justo. Ficar firme nas suas posições é louvável e o mundo precisa disso. O que não pode é entrar em suprema contradição ao sacrificar as evidências pelas atitudes definitivas num mundo dialético e em mutação.

RETORNO - Imagem de hoje: Vitrais da Igreja de Sint Janskerk, Holanda. Foto de Daniel e Carla Duclós. Imagem belíssima, que nos traga a paz de espírito pregada pela Igreja, que precisa cuidar do seu rebanho e não abandoná-lo na hora que mais precisa.

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