12 de julho de 2013

NÃO FIQUEI FERIDO

Nei Duclós

Não fiquei ferido. Conserto asas sempre que o voo sangra.

Quando vires o mar, saiba que virei sal.

Fui treinado novamente para o adeus. Uma lição que esqueço sempre que o amor faz a viagem de volta.

O amor que passa nunca existiu.

Não diga mais nada, entendi. Preciso agora cuidar das palavras para que percam esse mofo acumulado pelo fim.

Tomaste o amor sem dar nada em de volta. Levaste para longe, ave migratória.

Fio curvo de Lua, costura o frio noturno. Casa vazia de um botão mínimo, que deixa aberta a blusa de um convite.

Mesmo por um instante, quando voltas realimentas o que perdi para sempre.

Me adicionaste, subtraída. Multiplicas divisões em meu registro

Passaste por mim como um vento vindo de longe. Espero que retorne na curva da noite.

Tenho um amor que não existe, que desistiu de esperar. Sou um navio sem porto de chegar.

Até hoje eu lembro. Sinal que o tempo se guarda como um presente.

Esqueça-se de si que já perdi meus vínculos. Assim poderemos vibrar, intensos.

Estávamos perto. Mas nossas identidades atrapalharam. Melhor nos misturar ao dia, como faz o vento, que penetra por todos os poros.

Me devolveste o que jamais tive. Essas paredes de mel na minha fantasia.

Descobri tardiamente: não me queres mais. Quando me perdoaste, já era um adeus.

Tens o corpo suave como coberta de lã. Em ti me embrulho até amanhecer.

O inverno nos põe recolhidos em palavras no diminutivo. Ficamos sob tetos em casamatas de feltro

Melhor dizer só o mínimo para que o encontro não perca sua forma de magia.

Estive isolado numa ilha cercada por inúmeras distâncias. Mas vi o barco navegado por ti, peregrina.

Assomas de algum lugar bem na minha frente. Diga o nome do anjo que te enviou, graça noturna.

Não ceda aos meus encantos que te porei num canto. Meu vício é a sedução sem vínculo. Resista até o último assédio. Depois me capte com tua rede invisível.