22 de junho de 2007

MY MONEY



Ontem mesmo eu vi num filme um mafioso falar em “my money”. É o jargão dos bandidos. Onde está o “meu dinheiro”? A bunfunfa não é dele, claro, mas ele se apropria. Se o governo petista aumenta em 140% a remuneração dos cargos comissionados é porque está usando mal o dinheiro público. Ninguém tem aumento de 140%. Nos últimos três anos, estive num emprego e, nesse período inteiro, recebi um aumento de 6%.

Mas não pensa assim Marco Aurélio Garcia, assessor especial da Presidência, professor de História da Unicamp e um dos resenhistas da seção de livros que eu editava na revista Senhor dos anos 80, dirigida pelo Mino Carta. Quando acusaram o governo de ter dado o aumento extorsivo só para que as finanças do PT aumentassem, já que os militantes reservam uma parte dos seus salários para o partido, disse Garcia: “Eu dou muito alegremente o meu dinheiro para quem eu quiser.”

É uma meia verdade. O dinheiro, especialmente o que foi inflado com o reajuste astronômico, vem das finanças públicas. Garcia tem razão em parte: ele dá o dinheiro que recebe do governo para quem quiser. Mas se esse dinheiro vem desse reajuste abusivo, continuaria com a razão? Ah, não é abusivo? Então o assessor faz como bem lhe aprouver.

Nunca entendi como funciona o cofre dos governos. Quem assume o cargo executivo tem plenos poderes sobre a boca do caixa? É só ir lá e pegar? Decidir aumento e pronto? O orçamento fica ao Deus dará? Não estou confundindo dinheiro para obras e dinheiro para o funcionalismo ou para os cargos comissionados. Estou falando nas decisões.

Pronto, vou ganhar um milhão de dólares por mês. É assim? Sei, existem os tribunais de contas, mas estes agem depois que o dinheiro foi gasto, não é mesmo? Maluf é acusado de desviar 200 milhões de dólares só de uma obra, a avenida das Águas Espraiadas. Como uma cifra astronômica dessas passa, se for comprovado que ele desviou mesmo, incólume pela imprensa, os tribunais, a cidadania em pânico?

Depois de efetuado o gasto, não adianta chorar. Não sei de ninguém que tivesse esbagaçado a grana do contribuinte de maneira imprópria, esfregar a bunda em alguma cela. Pelo menos num prazo considerado normal quando há punição, e não os poucos dias que o nababo fica encarcerado para depois sair nos braços advocatícios. Mas os cargos comissionados são outra coisa. Ou tudo é o mesmo? Assessor especial vai ganhar agora mais 140%. Fica como está? O dinheiro passa a ser dele?

Mas esses caraminguás são mixaria perto do escândalo do Banestado, por exemplo, quando tudo ficou por isso mesmo. Ou dos sucessivos escândalos da Previdência. Ou do famoso encilhamento, na República Velha, em que a ladroagem política tomou conta das finanças da nação, já que não tinha mais o Dom Pedro II (que morreu pobre) para atrapalhar. Não se trata de monarquismo, mas de decência. O Imperador poderia ter sido substituído por alguém pior. Mas enquanto esteve no poder, rédea curta nas finanças públicas.

Como disse de Dom Pedro II o Monteiro Lobato: "O juiz era honesto, se não por injunções da própria consciência, pela presença da Honestidade no trono. O político visava o bem publico, se não por determinismo de virtudes pessoais, pela influencia catalítica da virtude imperial. As minorias espiravam, a oposição possibilitava-se: o chefe permanente das oposições estava no trono. A justiça era um fato: havia no trono um juiz supremo e incorruptível. O peculatário, defraudador, o político negocista, o juiz venal, o soldado covarde, o funcionário relapso, o mau cidadão enfim, e mau por força de pendores congeniais, passava, muitas vezes, a vida inteira sem incidir num só deslize.”

Hoje é contrário. Aumentos abusivos, viagens nababescas, mais de um bilhão por ano em publicidade. Mas quem está no trono é um exemplo de virtude. Não é mesmo? Nada de saudosismo dos tempos de El Rey. É preciso andar para a frente. Relaxar e gozar.

RETORNO - Imagem de hoje: Lee Marvin na obra-prima de John Boorman, Point Blank (1967). Ele passa o tempo todo procurando "my money", a grana de um roubo que lhe foi tomada (trailer no you tube).

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