2 de junho de 2007

O CONFLITO É DESUMANO




Humano é o que nos sintoniza em harmonia. O conflito, fonte da violência, é contra o que temos de humano. A moça não queria o bebê, no lugar de colocar isso na roda, discutir, pedir socorro, resolveu se livrar dele. O adolescente discutiu com o amigo, então foi até em casa, pegou o revólver do pai ou do irmão e deu um tiro na nuca do outro. Chavez não quis enfrentar a rede de televisão que lhe fazia oposição, então resolveu fechá-la. Não suporta críticas e decidiu cagar em cima do Congresso brasileiro. Como é um idiota, disse asneiras, como essa de que é mais fácil o Império Português se reinstalar em Brasília (meu Deus!) do que ele devolver o canal à oligarquia venezuelana.

No fundo se entregou: todo líder hispânico latinoamericano desses países que nasceram de lutas intermináveis uns contra os outros morrem de ressentimento do Brasil, a grande nação que soube se manter unida e expulsou a hispanidade gulosa. Chavez finge que ataca a direita brasileira, mas está atacando o Brasil, país que ele odeia e teme, e por isso, como um moleque de rua, vive passando a mão no presidente que elegemos aqui nesse sistema político viciado e corrupto.

Agora, o Sarney, fundador da ditadura civil, não deveria perorar contra Chavez, já que nada temos a ver com a Venezuela. O medo se justifica: e se resolvessem cortar as asinhas dos donos das grandes redes por aqui? Não sobrava um. O pior é que as redes não representam coisas como direita, esquerda, aristocracia etc. As televisões vivem à disposição de seus interesses e necessidades. Seu objetivo é sobreviver e crescer, como qualquer animal. E quanto mais crescem, mais imbecis ficam. E quanto mais sobrevivem, mais anúncios idiotas veiculam.

É uma lista interminável de sacanagens veiculadas pela publicidade. E ninguém “recrama”. A propaganda maciça de cerveja com o aviso cretino de beber com moderação, por exemplo. Como, moderação, se a cada cinco minutos grupos gigantescos de pessoas aparecem berrando e levantando os braços numa euforia que falta à vida real, para veicular as marcas hegemônicas? Vejam o caso dessa cerveja mexicana, que na versão brasileira não passa de mijo pôdre. É uma avalanche de apelos dramáticos para o consumo. Tínhamos inúmeras cervejas regionais e locais, todas foram sucateadas pelos monopólios.

Como não temos mais cerveja nacional, aliás não temos mais merda nenhuma nacional, então vem uma marca estrangeira e toma conta da televisão. Para isso servem os canais de TV, para nos massacrar. E os anúncios de automóveis, todos baseados na inveja e no exibicionismo de privilégios? Veja, seu melhor amigo já tem um. Seja diferente, tenha uma pista do minhocão só para você, pois a outra está lotada dos que usam os outros tipos de carro. Dia dos namorados? Compre a lingerie da rede de loja tal (as lojas do comércio são apenas agentes financeiros hoje; você se cadastra para se endividar) que assim seu namorado não brocha. E a propaganda do governo, o Brasil para Todos (Eles)? O que se passa na cabeça de uma jovem? Só sacanagem, usufruto, apelação. Assim se forma uma população de corpos disponíveis.

Como a mídia está a serviço do consumo desenfreado, do endividamento ascendente, do descarte de corpos estranhos ao modelito publicitário, então não existe uma massa cultural de resolução de conflitos. Todo mundo dança na hora em que dobra uma esquina e precisa se livrar de dois motoqueiros, um que vem pela esquerda, outro pela direita e não te deixam fazer a manobra. E há a justificativa de massa: conflito é natural, faz parte do ser "enquanto humano". Se faz tanta parte, por que levamos milênios tentando criar condições favoráveis à harmonia, nas comunidades, nas cidades, nas nações? Se fosse tão natural, então as instituições pregariam a guerra pura e simplesmente e não a paz, como acontece.

Harmonia: isso é coisa de saudosista. O negócio é partir para a porrada. E dê-lhe tiroteio na favela do Alemão. Sorte que temos o noticiário para mostrar como esse conflito sem fim não terá fim mesmo. É com você, bobão.

RETORNO - 1. Imagem de hoje: crianças se sintonizam enquanto os pais se submetem à desumanidade financeira. Foto de Marcelo Min. 2. Clicando na seta ao lado do título Diário da Fonte, um documentário irlandês sobre o golpe na Venezuela em 2002. Imperdível.

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