1 de dezembro de 2006




ATRÁS DO ESPELHO

Fomos poupados da visão de nós mesmos. A humanidade são os outros, enquanto habitamos este reduto indevassável, o ego invisível e secreto. Mesmo que isso seja óbvio, não atinamos, na prática, que fazemos parte do que os outros enxergam. Nossa aparência é a vitrine do que escondemos, imaginando que ninguém nota. Se por acaso damos atenção a essa verdade, a de que somos avaliados o tempo todo pelo olhar alheio, que nos captura em sua caixas mentais e complementa as frases que mal esboçamos, então nos tornamos escravos dos espelhos, esses traidores, que refletem a imagem invertida, o que nunca será nós, pelo menos na lógica cristalina das coisas. Permanecemos inacessíveis, enquanto representações de cada pessoa participam do teatro humano.

ESCASSEZ - A busca do conhecimento não é o mais importante, e sim a busca do humano. Ficamos afastados do humano quando abraçamos causas excludentes: a carreira, as aventuras, as lembranças, os times. Saber não é importante. Ninguém é mais chato do que o sabedor, sabichão, sabe-tudo, sabão. O pior é que o humano não são as cenas em câmara lenta do pai amigão e agora do Natal. Querem que seja, para que os produtos disfarcem suas origens. Qualquer produto industrial vem do lixo, do ventre da terra, e passa por processos fumegantes, mal-cheirosos, poluentes, a não ser, é claro, que faça parte das campanhas de responsabilidade social, quando a porcariada ganha status de comédia romântica. O humano é a escassez que busca transcendência, é o transcendental que encarna, é a lua refletida na poça do quintal e o beija-flor paradinho no ar diante da criança de colo. E muito mais, claro. O que pega é o humano e não a enciclopédia ou as ferramentas de busca.

BLOGUEIRO - Muito simpático o Luis Caversan, blogueiro da Folha. Ele respondeu com muita gentileza um e-mail que enviei comentando revelador trecho que ele publicou lá. Disse ele no blog, sobre a atual crise da aviação brasileira: "Uma pena, principalmente quando se pensa não apenas em Santos Dumont, mas também que o Brasil teve nada menos que 14 companhias aéreas em operação entre 1925 e 1954, que o tráfego aéreo no Brasil na primeira metade do século 20 só era menor que o dos Estados Unidos, que tivemos companhias fantásticas como a Real ou a PanAir, que a Varig foi uma potência mundial e manteve, durante anos seguidos, o melhor serviço de bordo do planeta..." Comentei o seguinte: "Que coincidência! A época mencionada coincide com a Era Vargas".Caversan esteve recentemente em Porto Alegre para fazer a curadoria de uma exposição sobre os 40 anos da Embratur e a mostra está no antigo Correio.

RETORNO - Foto de Antonio Gauderio, acervo Ima Galeria.

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