CARTA DE WAGNER CARELLI SOBRE MEU LIVRO
Meu querido amigo, escritor, editor, talento sem igual, criador,
solidário, visionário Wagner Carelli escreve sobre meu livro TODO FILME É SOBRE
CINEMA, que lancei pela coleção Aldus,
da Editora Unisinos. A carta dele diz o
seguinte:
“O livro é uma delícia
1) pela abundância de temas do cinema
e de modos de vê-lo;
2) pelo tratamento narrativo, mais que crítico, desses
temas, que obedece a todas as "Seis propostas para o próximo
milênio" (este milênio, já), de Italo Calvino: leveza, rapidez,
exatidão, visibilidade, multiplicidade e a sexta, que ele não chegou a
desenvolver, consistência (aliás, esses teus ensaios críticos estão para o
ensaísmo como, por exemplo, "Cidades invisíveis" está para a ficção);
3) pelas caixinhas de texto-jade, claras e brilhantes, todas do mesmo e preciso
tamanho, todas igualmente lapidadas com paixão cuidadosa, em que vêm embalados
os ensaios críticos, e
4) pela fidelidade rigorosa, sempre observada, com que
você se atém ao teu coração ao construir essas caixinhas, que não quer ver
transformadas em bibelôs, mas nas respostas únicas que só podem dar o coração
de cada um ao verter de um filme sobre ele.
"O que conta não é a posse sobre qualquer objeto que
contenha a obra, a exibição de conhecimentos eruditos ou rasteiros, mas o
resgate feito pela memória e pela criação. Um filme nos acompanha como um anjo
da guarda e se transforma em algo completamente diverso do que vemos escrito
sobre ele... Eu prefiro vê-lo do meu jeito." ("Hatari, a narrativa de
cristal", não por acaso, como tuas peças, "narrativa"; não por
acaso, "de cristal").
É uma fidelidade que se expressa de cara na epígrafe (*) tão bem
escolhida, em si um presente a mais pra este presenteado com teu livro, que não
a conhecia. Epígrafe que te guia como cada "anjo da guarda" a que
assististes: você não tem vergonha alguma de dizer, de alguma forma, de cada um
e de todos os filmes que te inspiram, que "é o mais lindo filme que eu já
vi".
Teu leitor tem de ser coerente: "Todo filme é sobre
cinema" é o mais lindo livro sobre cinema que eu já li.
Bacione, bagual véio, ninguém tem um coração como o teu.
Wagner "
RETORNO - (*) Dans l’histoire du
cinéma, il y a cinq ou six films dont on aime à ne faire la critique que par
ces seuls mots : « C’est le plus beau des films ! » Parce qu’il n’y a pas de
plus bel éloge. (...)Comme l’étoile de mer qui s’ouvre et se ferme, ils savent
offrir et cacher le secret d’un monde dont ils sont à la fois l’unique
dépositaire et le fascinant reflet. La vérité est leur vérité. Ils la portent
au plus profond d’eux-mêmes, et, cependant, l’écran se déchire à chaque plan
pour la semer à tous vents. Dire d’eux c’est le plus beau des
films, c’est tout dire. Pourquoi ? Parce que c’est comme ça. Et ce
raisonnement enfantin, le cinéma seul peut se permettre de l’utiliser sans
fausse honte. Pourquoi ? Parce qu’il est le cinéma. Et que le cinéma se suffit
à lui-même.(Jean Luc-Godard – Bergmanorama – Cahièrs Du cinema).
(*) tradução: na história do cinema
, há cinco ou seis filmes que gostamos de fazer a crítica com apenas estas palavras: " Este é o mais
belo dos filmes ! " Porque não há maior elogio. ( ... ) Como a estrela do
mar que se abre e fecha , eles sabem
como oferecer e esconder o segredo de um mundo em que eles são os única e
fascinantes depositários de reflexão. A verdade é a sua verdade . Eles se carregam
profundamente dentro deles mesmo, e ainda assim a tela rasga cada plano para
semear ao vento. Dizer que são os mais belos filmes , diz tudo. Por quê?
Porque é assim. E esse raciocínio infantil, só o cinema sozinho pode dar ao
luxo de usá-lo sem sentir vergonha. Por quê? Porque é o cinema . E o cinema está
contido em si próprio (Jean Luc Godard - Bergmanorama - Cahiers du cinema) ..
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