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1 de abril de 2010
ÍDOLOS
Nei Duclós (*)
Estamos na maré alta da demolição de ídolos, pessoas que viraram símbolos de algo transcendente e foram representadas por estátuas, pinturas e devoções. No seu lugar entram os chamados ícones, que são mercadorias de consumo infladas pela abundância da comunicação de massa e pelo ingresso de enormes contingentes no círculo de produção e consumo de imagens e mensagens.
Ao contrário dos ídolos, que chegaram ao pódio por força da vivência de povos e nações e das lutas por princípios e sobrevivência, os ícones são destacados ou substituídos conforme seu valor de mercado. Quando alguém que fez carreira focando suas “obras” no ato sexual ultrapassa os 50 anos, é hora de aparecer alguém com menos de 20, para assumir esse exercício frenético de exposição pública que virou moda.
Um evento que cai no colo do lucro é a morte prematura de uma notoriedade. Se não era encarado como estrela de primeira grandeza, passa a ser, já que existe espaço para a celebração que movimenta a carroça da compra e venda do imaginário excessivo em volume, mas escasso em idéias. Não importa a morte de um grande professor de História, que dedicou a vida a decifrar o país continente. O que vale é o criador de produtos aparentemente transgressores, no traço ou no ruído.
Essa contrafação alimenta a ilusão da massa convencida de que está na vanguarda, palavra que sugere um espaço sagrado da demolição de ídolos, mas ao mesmo tempo de consumo desenfreado e alienado de ícones. O truque mais batido é misturar os dois conceitos, fazendo o quarto de despejo ditar as normas da praça central. Os cânones são desmoralizados e nesse vácuo entra a procissão de nulidades tratadas como se fossem reencarnações dos deuses.
Isso ficou possível porque o sucateamento da educação serviu para a explosão dos limites que definiam parâmetros da cultura e do espírito habitado pela leitura, a reflexão e o exemplo. Quando aprovam analfabetos por decreto e garantem vagas para quem não consegue vencer uma barreira obrigatória como o vestibular, é porque um contingente ágrafo consome sem criticar e reproduz o que é imposto como se fosse natural. A tragédia fica completa no momento em que jogam lama nas inspirações que resistiram à corrosão do tempo e hoje são derrubadas à força pela barbárie travestida de modernidade.
RETORNO - 1. Imagem desta edição: Fofoca, obra de Ricky Bols. 2.(*) Crônica publicada no caderno Variedades do Diário Catarinense no dia 30 de março de 2010.
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