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12 de abril de 2010
O PREDADOR
“Cisnes se acasalam por toda a vida. Não somos cisnes. Somos tubarões” diz numa palestra George Clooney no papel de Ryan, o profissional contratado para demitir gente por toda a América, no filme Up on the air (Amo sem escalas, 2009). Foi indicado para seis Oscars, incluindo Clooney como melhor ator, melhor filme do ano, script (de Jason Reitman e Sheldon Turner) baseado em livro e as duas coadjuvantes, excelentes, Vera Farmiga no papel da imagem espelhada do predador e Ana Kendrick, a jovem scholar que quer informatizar o serviço das demissões. Não ganhou nenhum. O que deu errado?
Para mim, acertou no atacado – a concepção do filme é brilhante, pela atualidade do tema e dos personagens e pelo ritmo da trama, sintonizada com as inúmeras conexões necessárias para o predador se movimentar em seu ambiente e fazer estragos. Mas errou, várias vezes, no varejo. Primeiro, porque os realizadores imaginam que poderiam enganar o espectador. A mulher liberada que procura um relacionamento seguro não tem o perfil da dona de casa flagrada pelo ímpeto do amante. Na era do celular, ninguém toma uma avião para chegar de surpresa num lugar onde nunca esteve sem cair na tentação de fazer uma chamada.
Um cara escolado como Ryan jamais se deixaria enganar sem antes, pelo menos, consultar a moça em questão, tão bem sucedida . Ela faz o quê, trabalha em quê? O filme não esclarece, mas uma googlada mostraria tudo. Um noivo em dúvida jamais se deixaria levar por um argumento tão pífio quanto aceitar ter uma esposa como co-piloto, metáfora adequada ao filme, mas que não está à altura do argumento e do roteiro. O filme erra o oferecer clichês para solucionar situações complicadas.
O anti-herói no fundo é um bom moço – como já provou o sucesso do protótipo do gênero, o Ricky/Bogart de Casablanca. Mas o mundo ficou intrincado demais para suportar antigas soluções. O rapaz pronto para uma conexão com o mundo real não se deixaria levar pelas emoções, mesmo que a família tenha entrado no circuito. Os americanos no fundo não perdem os vínculos com suas patriotadas.
O profissional malvado acaba sendo um bom sujeito no trato com sua concorrente, a jovem recém formada que veio com idéias revolucionárias para a empresa dos cortadores de cabeças. O roteiro oferecia várias chances de desdobramentos, mas o diretor insistiu em alguns vícios, como a repetição exaustiva de situações – por exemplo, a rotina das conexões. Isso ficou claro nas primeiras cem vezes, precisava reiterar 800 vezes mais? Precisava também fazer um clipezinho na seqüência da festa, em que entram todos os lugares comuns, do karaokê aos hurras babacas coletivos e o banho de mar na madrugada. E ainda tem a filosofia barata de conseguir metas difíceis e na hora agá achar tudo uma besteira.
Trata-se de uma chance perdida de fazer um bom filme. Há a vantagem de o predador manter sua dignidade de um cara isolado e firme, que se entrega ao trabalho depois de fazer alguns atos caridosos. Mas desta vez, não por convicção, mas porque, como todo mundo, sofreu uma desilusão amorosa. É pouco para o personagens muito bem elaborado por Gorge Clooney, um ator que não costuma errar e um realizador que não cairia nas armadilhas que enredaram o diretor Jason Reitman.
Assim mesmo, com todos os defeitos, gostei de ver. É o que eu chamo, numa gíria doméstica, de “pororoca”. Porque uso esse termo, não me pergunte, esqueci (talvez porque promete muito e só faz marola). Mas funciona de ouvido. É uma boa pororoca.
RETORNO - Imagem desta edição: George Clooney em "Amor sem escalas".
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