Nei Duclós
Fiz uma proveitosa consulta a trechos do livro “Ecology,Economy and State Formation in Early Modern Germany” , de Paul Warde (Cambridge
University Press, 2006), que lança luzes sobre os motivos de a Alemanha ser o berço
da ecologia. Tem a ver com a cultura alemã formatada por camponeses no século XIII
e que permaneceu intacta por 600 anos, até o século XIX.
Que cultura
era essa? Uma sólida estrutura econômica
fundada na relação regrada com os recursos ambientais. Quem vive no
campo sabe: é preciso diminuir ao máximo os riscos para a produção, as
interferências do clima, as possibilidades de escassez seguidas de fartura. Para
que haja um mínimo de prejuízo, deve se estabelecer uma conduta coletiva que
afaste as ameaças para uma distância segura. Isso significa agir em comum
acordo com a vizinhança para preservar de maneira sustentável os recursos
naturais, especialmente a madeira, base energética que perdurou séculos antes que
as inovações tecnológicas liberassem o carvão mineral para mover as novas
indústrias.
Na Alemanha
profunda, o estado unificado surgiu nesse ambiente de preservação. O conglomerado
de aldeias e distritos que conviviam em territórios em disputa estabelecia limites.
Se, por exemplo, a minha árvore faz sombra para a sua grama, prejudicando a
alimentação do seu gado, é justo que
você usufrua de uma parte da produção da minha árvore. O corte da madeira
precisa ter fiscalização rigorosa para que se mantenha a principal fonte de
sustento de uma economia de subsistência.
Para tanto,
era preciso guardas que mantinham atento controle do uso dos recursos naturais.
Nem sempre com sucesso, pois os habitantes transgrediam as regras em favor dos
seus interesses e era preciso enquadrá-los para garantir a subsistência de
todos. A madeira acumulada em depósitos ou as casas feitas das árvores
precisavam por exemplo, ter demarcações seguras para evitar incêndios, uma
providência aprendida na prática
Esse sistema
gerou a estrutura do estado nacional, que nos primórdios ainda estava às voltas
como uma série de heranças da tradição mística. Os médiuns que viam fantasmas e
anunciavam suas profecias eram enquadrados como um fator de desequilíbrio
social, pois poderiam prever catástrofes colocando em pânico uma população
amarrada a crendices. Os místicos eram igualmente monitorados como qualquer
criador de gado ou plantador de grãos. A relação religiosa com a natureza e
seus poderes sobrenaturais, que povoava a imaginação coletiva, duelava com a
lógica racionalista que no século 19, época em que foi criado conceito da
ecologia, ganhou grande impulso com as descobertas científicas.
A revolução
industrial, de origem britânica e que usava o carvão mineral, se opunha a esse
sistema secular alemão da tradição de respeito ao ambiente em favor da
sobrevivência não apenas das comunidades, mas da nação. Era questão de honra
cercar a defesa ambiental de todo o aparato legal possível para não ser
desmoralizada pelo iluminismo francês ou o pragmatismo britânico. O comportamento,
a tradição, os hábitos familiares, tudo ficou tomado por esse sistema que
garantia a vida. O romantismo alemão surge assim como um fator de resistência, acrescido
de uma forte tradição religiosa, pelo peso do misticismo ancestral, o enraizamento
dos costumes e o isolamento natural de uma sociedade que precisava se preservar
da invasão dos forasteiros.
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