Nei Duclós
Não lembro
aniversários, só de um
aos dez anos de
idade, quando esqueceram
a data. Fiquei em
silêncio para marcar território
Imaginei que isso
atrairia o remoroso e iriam
me festejar
tardiamente, o que daria vez
para eu expressar
minha total decepção
Só que ninguém
atinava com a birra
até que, afogado em
mágoa, fiz um gesto
para desencadear a
lembrança.
Foi quando
despencaram com abraços.
O presente veio
tarde, acho que era um revólver
que usei para matar
todos os meus sonhos
Foi minha cicatriz
mais profunda
Se aquilo acontecia
numa família
imaginem num campo de
concentração
numa passeata, num
escritório. Se uma casa
se prestava para
tanta dor, daria para ver
o fim do mundo em
qualquer praça
Mas o tempo passou e
descobri
que tinha sido meu
melhor aniversário.
Revelou que nada tem
importância,
que somos pó e ao pó
voltaremos.
E quem se importa com
bolo e velinhas
quando se usa ainda
calças curtas?
Aproveitei para ir ao
cinema, ver um faroeste
Lá sentei com
cerimônia na cadeira, sozinho
e falei para John
Wayne armado de chapéu e balas
que tinha chegado a
hora da minha morte
Ao que o cowboy
replicou, sábio e sarcástico:
Não terás tanta
sorte!