Nei Duclós
A poesia se segura até o dia
em que explode a insurgência
na rua e o confronto é maior
do que a ilusão da matéria
forjada na oficina, de trovão
submisso em caldeiras
A massa briga pelo tempo
omisso e o silêncio que virá
se houver derrota. as prisões
se enchem de injustiça
e a tirania é a voz imposta
sobre o grito de revolução
Toda geração tem seu batismo
sob a capa do tempo que se diz
pacífico e não passa de caldeirão
de lava sobre o peito e os pés
em luta contra a preguiça,a fala
enfim desperta em carne viva
O poema perde o sentido
quando o coração se ocupa
da coragem física, a narração
exige a imóvel percepção,
há um rastro, uma explosão
onde a palavra se carboniza
Mas das dores resurge a poesia
de cara crispada na avenida
e na multidão medra o autor
ainda no ninho, a desencavar
o som que o alimentará
na mudança de um estigma
Pulmões berram e se ajoelham
exigindo harmonia na confusão
de estiletes e gases contra vidros
e a lógica da desrazão
impune
mantém o horror e a teimosia
num ruído de correntes partidas
A manifestação e o verso
dão-se as mãos quando se rompe
a rosa de Hiroxima e das cidades
insepultas. o recital é o radical
choque entre ficar e se expor
no súbito pente fino do destino