Nei Duclós
Gritávamos amor o tempo todo. Acho que escutaram.
No lado B da reivindicação expus um coração vermelho. Vinhas
atrás de mim.
Me empresta teu cartaz? disse ela. É exatamente o que eu
penso. Fica com o meu, ainda em branco. Escreva que me ama.
Nos cartazes pusemos tudo o que achamos errado. Nos bilhetes
repassados um para o outro tudo o que precisava dar certo.
Escrevemos um romance nos cartazes expostos na caminhada.
Começava com naquele dia e terminava com felizes para sempre. Da janela jogavam
papel picado.
Vocês não deveriam vir para a rua num dia patriótico só para
ficar assim grudados, disse um invejoso. O amor lidera, dissemos a uma só voz.
Fomos tomar um café para fugir do quebra quebra. Foi a
primeira vez que ficamos juntos. Choravas de emoção, e não era por obra do gás
lacrimogênio.
Apontaste a lente para mim para ler o cartaz que levei na
manifestação. Amor agora, eu dizia.
É bizarra essa vontade de te dar um susto, de ser teu
suspeito número 1 quando alguém cobre teus olhos pedindo para adivinhar.