10 de fevereiro de 2012

FOLHA


Nei Duclós

A noite cai, inútil, sobre o poema, folha amassada no ventre do verão exausto.

Não sinta vergonha. Sumiremos no ar em pouco tempo. Ficará apenas esse gesto de amor, como nuvem suspensa no eterno

Sou teu alvo, Cupido. Onde guardas as setas para alguém que compartilho?

Virou o tempo e o calor acabou em vento. Fim da tarde neste fevereiro tão grudento. Nuvens intensas prometem não ter Lua novamente. Só dentro de nós o amor tempera o clima mais ameno.

Vem que tarda coração de manteiga. Te prometo tesouros, até os falsos, do meu sentimento, já que deixas escorrer os dias sem teu beijo. Faço qualquer coisa para ter teu abraço esplêndido.

Não tem mistério a palavra de amor posta no bolso. É como moeda antiga sem serventia. Todos conhecem mas ela nada compra. É uma espécie de sinal coletivo de chamegos.

Não sou brilhante, sou tua bijouteria.

Já perdi, agora aguardo com meu sentimento. É uma pomba que me ensina o vôo quando se lança sobre a noite incalculável de estrelas.

Sopro teu rosto para ver se piscas. Estás no meu colo, indiferente, seriíssima. Como último recurso, em vão, choro, matriarca de delícias.

Sumiste de vez. Fiquei a ver navios em plena seca. O mar foi tragado pela saudade. Não voltará a ventura de ser teu.

Estou aqui, disse ela, em outro planeta.

E sabe então o que ela falou? Nada.

Por que sonhamos? Para projetar a vida que não deveríamos perder.

Não fugirás do que amo. Não que estejas presa, mas porque assim combinamos, sem sequer saber onde estivemos.

Tão bonita, de tão poucas palavras. Elas me bastam e me ensinam pelo corte enxuto e o passo trêmulo na calçada forrada de flor.

Você passou por mim e tive coragem de dizer. Se não deu certo, não foi culpa do poema, mas do destino, esse pregador de peças.

Agora repousa e sonha. Sou o confisco do teu corpo em movimento de águas. Mergulhe no que parece não existir, mas é só o que temos.

Boa noite, coração ao vento. Pássaro é o verso, que te alcança.

Moro no poema, exílio de esperança. Ame.


RETORNO – Imagem desta edição: Berenice Bejo no papel de Peppy Miller em O Artista.

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