28 de fevereiro de 2012

GOTAS


Nei Duclós

Não fiquei preso às raízes e ao barro, falando sobre nadas. Levantei as nações da poesia com um berro, que se desfez em gotas de um perfume raro.

Quando falarem em poesia, escute os chocalhos dos vendedores ambulantes de conchas raras. É um código. Eles fazem isso para conversar com meu espírito.

Nunca li nada seu, disse o antologista. É que não existo, respondi. Nasci em outro lugar e outro tempo. Só o amor tomou conhecimento.

Depois perguntarão: que fizeste? Joguei o poema para o céu e ele se multiplicou em milhões de estrelas, direi.

Não tenho mais o que fazer, a não ser mexer no pão da palavra do próximo amanhecer.

Agora esqueçam, o corpo voltou ao rumo. Remo em direção ao sopro divino que alimenta os deuses

Aquele corpo de seda me puxou para a cama e disse agora chega. Venha contar seus versos para a madrugada, irmã da primavera.

Não era minha vez de chorar, meus mestres. Mas as mulheres assim o quiseram, porque me fazia mal: era demais o sonho represado no olhar.

Tão pertinha que sinto o respirar sobre o vidro.

O poema fica no coração de quem ama.

Ela foi atrás de si mesma. Acabou me encontrando, no plantão eterno à espera do seu beijo.


Poesia é como época de colheita. Só fazendo festa para bater parte do estoque. Não há sede para tanta obra.

Vi meu poema na garupa de alguém e mandei um exército resgatá-lo. Ninguém abandona a aldeia sem o brasão marcado na pele.

Levantei velas em direção ao destino: teus olhos.

São alguns versos que sobraram. Tive preguiça de guardá-los.

Se fosses feita de areia, eu, mar, te levaria.

Exatamente meia noite. Ficaste invisível. Talvez seja a roupa. Onde puseste?


RETORNO – Imagem desta edição: Monica Vitti.

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