25 de fevereiro de 2012

PLANTA


Nei Duclós

Sou tumbleweed, aquele resto de planta que rola pelo vento do deserto e sopras incessantemente até os confins do mundo.

Mulher custa a agitar as águas interiores. Não a deixe no alto da onda, senão terás que agüentar a ressaca de seu desejo sem chão .

As palavras fazem o que querem comigo, e não o contrário.

Não inventei nada. Tudo é criação das musas que nos deixam perdidos só com um jeito oblíquo de segurar o cabelo.

Nada prestava nela. Principalmente seu jeito de segurar o celular. Implicava com isso. Queria morrer quando ela sacudia a mão livre enquanto apertava o aparelho no ouvido com a outra. Dizia para mim: pára com isso, lindíssima!

Desististe depois de tantas palavras ditas. Quem sou eu para sonhar com a volta?

Tenho uma entrega para fazer: meu coração embrulhado para presente. Não quer saber o que tem dentro?

Em que você está pensando? disse ela. Adivinha, disse ele.

Não agrupe indivíduos em sua percepção. Não veja outro quando olha um e vice versa. Os alvos podem não gostar.

De que falas? pergunta o vento. Dos amores que não alcanço, explico. É minha especialidade, disse ele. Sopro na janela dela, em vão, há séculos.

O amor é feito de pequenas implicâncias. Vê se deixa umas unhas do pé sem pintar, para que caibam meus beijos.

Quero ver agora que estamos de frente. Quero ver, e não apenas com os olhos.

É como no circo, quando caímos juntos com a trapezista. Como nas sessões espíritas, quando incorporamos criaturas do Outro lado para acariciar um sonho. Assim é o toque do poema.

Isso não leva a nada, ela me disse. Por que então chove antes da chuva?perguntei.

Sou só o sujeito da entrega. Não sei ler, disse o Alfabeto.

O amor acabou, junto com a tarde. Olhar tua foto é como um crepúsculo.

A noite virá repetir seus sortilégios. Sussurros conhecidos. Promessas de outras vidas. Cansei de ficar a sós com a multidão de estrelas.

Enquanto não derrubarem todos os ninhos não descansarão. Por isso cortam as árvores e passam trator no chão. Os pássaros são a representação de um Deus interior proibido de sobreviver.


RETORNO – Imagem desta edição: Angie Dicksinson.

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