23 de dezembro de 2011

ÍNTIMA MÚSICA


Nei Duclós

Refaço o rumo, ou esclareço a trilha quando acendes a luz. A que trazes de ti, íntima música

Agora que me tens e brincas com minhas palavras, posso dizer a mim mesmo que posso ter esperança? Ou continuarei no limbo do começo?

Conversamos normalmente como se não houvesse nada entre nós. Mas de longe as pessoas notam a delicadeza do teu toque no meu braço

No primeiro dia em que enfim nos encontramos,dissemos coisas banais sobre o ambiente e o clima. De repente teu olhar me abate como um míssil

Vamos nos falando, disse ela há cem anos

Tens tantas histórias, me disse ela antes de partir. Sim, a melhor é a contigo, falei para a estação vazia

Cansei de te sussurrar segredos. Agora falo alto para você ouvir.

Aguarde a próxima mensagem, disseste nas entrelinhas. Quem sabe meu coração sente saudade

Não quero mais que me abrace, ela falou. Melhor ficarmos distantes, neste banco apertado de praça, meu amor

Não se preocupe, isso passa, falei. Já estive assim antes. Em outra encarnação, em outra eternidade. O amor de hoje também fará parte das estrelas

Você é bonita, falaram para a palavra. O importante é o meu significado, disse ela

Romantismo é um bom nicho de mercado, disse o pragmático. Não tenho valor se ela não me quer, disse o coração

Gostou da minha coleção de palavras? perguntou o beletrista. São comportadas porque estão na cela, falei. Solte que elas te mordem

Tenha cuidado com as palavras, disse o censor. Ah, são suas? perguntei

Coloquei alguns poemas na cabeceira da cama, meu amor. Para estarem lá no teu despertar

Talvez amanhã ela me convoque. Há tanto o que fazer. Uma conversa sobre tudo. Um passeio na tarde. E um até logo interminável, daqueles que melam calçada

O sentimento é o verdadeiro amor, independente de quem for o alvo

Não devemos implorar carinho, a não ser que sua paixão esteja fazendo parte da indiferença da paisagem

Jogaste fora as coisas inúteis que se acumularam no ano: chocalhos, porta-retratos, versos esparsos de amor, sapatinhos de cristal

Entramos em recesso, disse ela. Fique aqui, colecionando estrelas. Depois me dê, quando eu voltar do exílio, vazia como um trem abandonado


RETORNO – Imagem desta edição: obra de François Gall

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