4 de dezembro de 2011

ENCONTRO EM VENEZA


Nei Duclós

Será na Praça de São Marcos. As pombas indiferentes não saberão o destino do coração apertado. Estarás linda, como numa pintura. E eu com os pés trocados

Mulher se descobre quando liga a mágica. Nem precisa de aparência, sotaque: basta o que faz com a palavra. O poeta se toca

Ontem foi um monte porque ela não falou nada. Hoje foi um monte porque ela falou tudo

Ela manda uma canção acompanhada de um comentário, um toque. Gentil, feminino, doce. Mas tem o efeito de uma bomba

E agora o que faço com o resto do dia? Não porque o jogo tenha acabado, mas porque não ganhei o título, tua presença inundando a eternidade

Estou acostumado ao teu ritmo. Danço em câmara lenta, como nos filmes. Ensaio o próximo passo, quando estiver na tua frente, com uma flor

Não é que eu esteja apaixonado, longe disso. Só acho que não tolero mais ficar sem te apertar contra o colchão ou a parede. Só isso

Passo o domingo à toa, aguardando teu aceno, mesmo de longe, sacudindo um pano. Mas não há mais lenços contigo. Gastaste todos chorando

Faça algo útil, me diz o feitor. Vá roçar grama. Eu concordo, até vou. Antes, preciso passar no correio te avisar que morro. Ou dizer te amo

Começa cedo tua compulsão pela poesia, disse o conselheiro. Verdade, respondi, o que me falta me acorda, mas jamais me deixa triste

Entendi. Ela quer jogo aberto, sem paixão inútil, corpos que se encantam e brilham na sintonia humana, com todos os beijos e ruídos

Ganhei o dia. Levei-o a passear na alameda da tua cidade,o encantamento.Agora posso sonhar com o que tenho: nada,essa promessa de felicidade

Um mar de poemas para cada gota da tua atenção. Oceano de espera e meu coração na praia,vivendo do que vertes,escassa,para paixão tão vasta

Cansei de seguir cometas de alumínio no cosmo artificial do que nos resta de tempo. Quero teu bocejo morno no acordar da sesta, quando eu for teu piso



RETORNO - Imagem desta edição: Audrey Hepburn

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