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23 de agosto de 2010
CANDIDATO É LINGUAGEM
Na sociedade do espetáculo, em que tudo vira mercadoria exposta, especialmente as consciências, o Brasil comparece com atrações de sarjeta. Nas campanhas eleitorais, tanto a anti-candidatura do palhaço Tiririca quanto às consideradas sérias, não passam de discurso, aquela trama de palavras e imagens em busca do voto ou de sua desmoralização.
Como não há democracia, não há relação entre as necessidades do país e os projetos para a escolha do eleitor. Não há eleições, mas números circenses de última categoria. Com o detalhe de que nós somos os engolidores de fogo.
No Twitter, tracei o perfil dos truques do marketing eleitoral para ilustrar a evidência de que candidato é linguagem e que no discurso tudo cabe. Vamos às frases, que obtiveram boa repercussão entre meus atuais (mais de ) mil seguidores:
Campanha eleitoral é maquiar o rosto até transformá-lo numa máscara de sorrisos ou sussurrar abobrinhas como se fossem revelações divinas
Debruce-se sobre um projeto. Escute atentamente os interlocutores. Aponte um mapa na parede. Pose ao lado de um monitor aceso.
Insurja-se contra a falta de governo, principalmente se for candidato a reeleição. Denuncie "esses que estão aí"
Convoque os parentes para chorar diante das câmaras. Abrace a professora do primário, mesmo que ela já tenha morrido. Denuncie a gripe
Afaste os braços do corpo enquanto caminha, rodeie-se de puxa-sacos e acene para gatos pingados miseráveis na favela. A campanha está feita
No palanque, dê as mãos para seus comparsas e levante os braços, enquanto canta o hino nacional. Fale democracia a três por quatro
Diga obviedades como se fosse maná distribuído ao gentio no deserto. Seja interrompido pela claque a 20 real o dia por cabeça. Esganice-se
Aproprie-se de todo o trabalho feito pelos outros. Olhe firme para as câmaras juntando as mãos em sinal de firmeza. Minta com convicção
Instale-se na poltrona e lembre sua infância pobre.Diga como era difícil comprar uma camisa.Sussurre como se fosse um gato angorá. Já ganhou
Abrace criancinhas, coma maionese, beba cafezinho, aperte as mãos dos atendentes de lojas e diga seriamente a maior asneira que lhe ocorrer.
Ponha um capacete de operário, tire o casaco e arregace as mangas, afrouxe a gravata e aponte para o horizonte. Está eleito
Depois de todas essas cenas, vá jantar com a cachorrada que garante a bufunfa da campanha. Defina quanto vai sobrar. Gargalhe, se sacudindo
Democracia é quando dois ou três institutos de pesquisas não auditados elegem alguém no primeiro turno três meses antes das eleições
Deveria haver uma lei: antes da propaganda de cada partido, deveria ter uns três minutos da propaganda da eleição anterior
Biografia política é ter sido figura obscura de gabinete ou malabarista de mandato usado como trampolim para cargos mais altos
Oposição é quando o mais destacado candidato adversário do governo diz que é amigo do chefe do governo
Os personagens dos comerciais mentirosos são: o "povo" (sorridente), o especialista (de jaleco) e o patrão, apontando para a obra
Pessoal que colhe as frutas abundantes nos comerciais mentirosos tem todos os dentes. Conta agora aquela do papagaio fanho
Sobra maçã nos comerciais mentirosos. Em qualquer lugar, maçã boa custa uns 5 paus o quilo. Poucos compram e vai tudo para o lixo
Dois Barbudinhos Apressadinhos de Expressão Esperta pontificam nos comerciais. Um vende carros, outro a candidatura do governo. São gêmeos?
A mentira sussurrada, apoiada por fatos suspeitos com aparência de verdade, é um discurso seboso e insinuante que dá o tom na campanha da TV
Interrompemos nossa programação planejada por anormais para transmitir o programa de anormalidades políticas
Ampliar e aprofundar o processo é manter mordomias. Fazer oposição é posar ao lado do adversário. Esse Brasil poder mais assusta
Emprego é disputar vaga de passeador de cachorro e ser reprovado para trabalho especializado. Crescer é subornar classe C com crédito podre
Saúde é te rala aí. Educação é poder ameaçar os professores enquanto come a merenda. Transporte é pagar os tubos por lata velha.
Não entendo nada de lei, mas propaganda eleitoral em programa infantil na TV não seria abuso de incapaz?
RETORNO - Imagem desta edição: Escolhas, de Ricky Bols.
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