5 de novembro de 2008

SUA EXCELÊNCIA O DELEGADO


Não comentei as eleições americanas porque não entendo como funcionam, por mais que expliquem. Parece eleição de séculos passados. Na época do Império, votava-se no eleitor. Esse eleitor é quem elegia o candidato. Na República Velha, um colégio eleitoral partidário é quem decidia a vitória. O cara podia ganhar nas urnas, mas não levar.

Eleição americana é parecido com essas coisas, mas ainda é mais complicada. Não dá para acompanhar. Você vota num dos dois candidatos, mas elege o delegado. Ou o delegado já foi eleito antes? Quando? Esse delegado, seja lá quem for, elege o candidato que já foi votado nas urnas. Ou seja, o delegado, sem rosto, anônimo, decide sobre quem é conhecido, popular, espirituoso e ainda ganha da Hillary Clinton.

Vamos imaginar algo semelhante no Brasil. Cada estado tem um xiz número de delegados. Quando mais populoso, mais delegados. Isso contraria o atual sistema político, implantado pela ditadura e que serve para celebrar os grotões. No Caixa Prego, três votos elegem dois senadores. Em São Paulo, um milhão de votos não elegem um vereador.

Mas, se a regra mudasse e imitassem os americanos? Minas teria um monte de delegados. Decidiria todas as eleições. Aecinho sairia da balada direto para o Palácio do Planalto. Decretos determinariam que JK inventou a bossa nova, o Volks, o cinema novo. Seria eliminada a figura do Jânio Quadros, que foi eleito na seqüência numa campanha anti-corruppção.

O problema, num caso desses, é evitar os trocadilhos. Tudo que é delegado de polícia iria querer se candidatar com o apelo “Vote no delegado”. Sambista com esse apelido também. Inventaria mordomias. “Aqui é o delegado”, diria, para o restaurante mais próximo, exigindo buffê chic servido em casa. Haveria, enfim, uma tendência irresistível de delegar, coisa que as consultorias batalham sem parar junto aos empresários. Delegue, delegue, dizem eles, tentando convencer os caras a sair de cima e deixar os outros trabalhar. Já deleguei, diria o patrão. Conheço o meu gado, digo, meu delegado.

Está previsto na Constituição americana uma traição: o delegado pode não indicar o candidato votado, simplesmente porque ele é quem tem a palavra final. "Mas, seu delegado, o senhor vai me prender? Mas eu votei no seu candidato". "Não interessa, aqui quem manda sou eu. Guardas!" Seria o caos se isso acontecesse nos Estados Unidos. O sujeito dá uma lavada no outro e acaba nas malhas da Califórnia, com os votos sendo contados em cartões perfurados da IBM. Brutal.

Acho que os delegados deveriam eleger, não o candidato mais votado, mas o delegado mais carismático. Ou seja, a população comparece em massa nas urnas e quem vai para a Casa Branca é o Doutor Padilha. No primeiro dia de poder, ele decreta o fim do escrivanato. Nunca gostou mesmo desses caras que ainda usam a velha Olivetti em vez de algo mais moderno, como o IS Plus ou o Redator PC. No segundo dia, a ordem seria entupir as cadeias. Delegado precisa mostrar serviço.

O Doutor Padilha não viajaria, ficaria despachando na Delegacia Oval. "Chanceler de Tovalu, manda entrar. O que o elemento quer? Pensa que eu não sei que está usando a mala diplomática para contrabandear Ipods? Vai para o piano. Alemão, bota tinta nos dedos do suspeito. Vamos ver se tem prontuário. Toma nota de CIC, RG. Não dá moleza, não. Se reclamar, desce umas bifa na oreia. Ninguém se mete a engraçadinho no meu plantão".

Acho que o mundo tomaria jeito. A população iria se convencer que o Doutor Padilha fora a melhor solução. Todo mundo vai querer imitar seu cabelo lambido para trás, sua gomina no topete, suas costeletas e bigode. Doutor Padilha, o Delegado. Vai encarar? Os argentinos teriam vantagem. Chamariam Padilha de Tche Loco. E aproveitariam para falar mal do Brasil. "Lá tem delegado demais, Tchê Loco. Melhor dar um jeito nisso. Eles podem querer se candidatar por aqui".

RETORNO - 1. Apesar dos esforços da Globo, que seguiu seus velhos hábitos e tentou proconsultar os resultados, forçando a mão para o lado do candidato de Bush (na cobertura das eleições na "demoucracia mais pouderosa do plaaaneta", como disseram até a exaustão) , deu Barak Obama. Mas cuidado. Cansei de repetir aqui. Não existem raças humanas. Raça, na humanidade, é um conceito enterrado pela ciência. Insistem em usar por motivos políticos. Obama não é negro, é americano. Obama não tem nada de afro. O Havaí não é Burundi. E Harvard não é a Etiópia. Ele nem é mais democrata, é presidente eleito. Preparem-se. Prometeu recuperar o prestígio perdido dos Estados Unidos. Ou seja, sairá de onde fracassaram (Iraque) e vai apostar todas as fichas onde podem ter controle total, com mais lucro e menos desgaste, por aqui mesmo. Amazônia, Aqüífero Guarani, Tríplice Fronteira, etanol, tudo o que eles têm direito. Será mais pesadelo. À parte isso, haverá a velha lua de mel da mídia com o poder. Obama para cá, Obama para lá. Venha levar tudo, nos repartir em postas, que no fundo gostas.

2. Gostou do Doutor Padilha na Delegacia Oval? Então adquira para sua biblioteca, ou para dar de presente este fim de ano, meu livro O Refúgio do Príncipe - Histórias Sopradas pelo Vento, que contém algumas jóias do
Diário da Fonte. Custa apenas 20 reais, com frete incluído, para qualquer parte do Brasil (Correio normal). Envie um e-mail (neiduclos@gmail.com) dando seu endereço, que eu retornarei com um exemplar autografado e o número da conta para o depósito. Não se acanhem. Miguel Ramos, o maior ator do Brasil, repercutiu esta campanha no Orkut. Ele recomenda.

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