20 de julho de 2008

A REPORTAGEM DE TELEVISÃO


Na televisão, a reportagem só funciona se você decidir com antecedência o que ela vai ser, como vai se estruturar, quem serão os entrevistados, o que exatamente vai ser dito. Porque é muito dinheiro empatado numa locomoção de equipe, num equipamento sendo deslocado, profissionais engajados durante várias horas do dia para conseguir sempre um pequeno resultado em termos de tempo e de impacto. No noticiário, esse é um desafio tremendo, pois você precisa abastecer uma hora (que em televisão é uma eternidade) de conteúdo. Vemos o que acontece: os apresentadores falam demais, os repórteres dublam a realidade e as imagens de repetem. É uma vida de cão.

O telespectador é o mais cruel dos animais de estimação. Mal agradecido, critica a redundância, se cansa dos mesmos rostos de sempre e implica com as gracinhas que tentam dar molho à maçaroca. Como a televisão sobrevive com um barulho desses? Simplesmente decreta o AI-5. Já sabemos como vai ser a reportagem: a chamada às vezes é maior do que a notícia, a entrevista é um jogo de cartas marcadas (onde o repórter implanta a reposta na maior cara dura) e os assuntos obedecem a uma lógica irremovível.

Assuntos de saúde, por exemplo. Você tem que fazer exercício, ponto, senão o bicho vai te comer. É a difusão sumária de uma droga, a endomorfina, que o corpo produz quando faz muito movimento. Vicia e produz corpos deformados, como acontece com o Sylvster Stalone, que aparece agora num comercial sendo abraçado pela Gisele Bunchen (se fosse ele o abraçador, Gisele, pobrezinha, seria reduzida a pó). Tem outra propaganda, cheia de muxoxos, do Pierce Brosman, que chega numa festa e carrega uma modelo brasileira (para onde?). No concerto internacional das nações, o Brasil entra sempre com a mulher. Nem sempre foi assim.

Mas e a reportagem de televisão? Ah, é mesmo. Como um assunto só pode render bastante, fica mais fácil. Se for a menina jogada do prédio, ou se for o banqueiro que fica mudo quando “dá depoimento” (como insiste a imprensa), basta repetir à exaustão, colocar links na frente de cadeias e residências e pronto, está garantido o espetáculo. É tudo jogo pesado, que mais tem a ver com as dificuldades de se fazer televisão do que com má fé ou coisa parecida. Claro que tem manipulação, mas acho que o problema é mais embaixo: é praticamente impossível fazer reportagem de televisão sem alguns vícios e muletas.

A cobertura especializada é outro desafio. No esporte, o pobre do Tadeu Schmidt, da Globo, tira leite de pedra para não cair na mesmice quando divulga os gols da rodada. Tadeu está acima da média dos jornalistas do ramo e às vezes faz coisas primorosas. Mas tudo vira a mesma coisa, com o tempo, e a gente cansa de ver tanta firula sobre um jogo de futebol. A informação vem junto, mas a prioridade é o espetáculo. O show repetido à exaustão funcionava no teatro, mas no meio audiovisual de massa se transforma numa armadilha.

O respiro para o sufoco é a chamada materinha humana, normalmente linkada com bons sentimentos, Ongs e programas como Criança Esperança. Há a Neide Duarte, com aquele tranco idêntico ao dia anterior, procurando emoção com o mesmo tipo de entonação. É o estilo, dirão. É a televisão mesmo, com suas limitações. É assombrosa a quantidade de gente necessária para levar alguma coisa de produção própria no ar. Mais fácil é chupar conteúdos vindo das agências e de canais estrangeiros. O brabo é ter que produzir sem que haja um sistema político, econômico e social decente no país. O noticiário de TV é uma ilha de perplexidade num mar de miséria e violência, que é o Brasil realmente existente.

Um expediente muito usado nos últimos tempos, é filmar impressos. Destacam-se textos, relatórios, parágrafos, frases. As imagens são feitas apenas por palavras. E tem a interminável sucessão de telefonemas grampeados. É difícil engolir esse monte de conversas lombrosianas decidindo milhões de dinheiro público em conversas cheias de analfabetismos. A malta que dispõe do dinheiro dos impostos nos assombra com sua estultície e suas espertezas.

A imprensa precisa estar acima dessa canalha. Não de maneira sombranceira, como se fosse a ditadora de moda e ética. Mas encontrando soluções técnicas e jornalísticas adequadas a esse meio ainda a ser descoberto, a televisão.

RETORNO - Imagem de hoje: Detalhe da catedral Notre Dame de Paris, fotografada neste mês de julho por Daniel e Carla Duclós.

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