Nei Duclós
- O que "dizem" os primeiros acordes da quinta
sinfonia de Beethoven? Nada, não há conteúdo. Mas sobre em sugestões de coração
e mente. Poesia também é assim. É música, suas notas musicais são as palavras.
Não "diz" nada, apenas compõe uma melodia.
- Discordo. A poesia sempre tem um recado, algo a dizer. Se
fosse só som de palavra não teria força nenhuma.
- Vamos então pegar um soneto de Camões, publicado esta
semana na coluna Jornal da Imprença de mestre Moacir Japiassu. Diz a última
estrofe do Primeiro Canto:
"No mar, tanta tormenta e tanto dano,
Tantas vezes a morte apercebida;
Na terra, tanta guerra, tanto engano,
Tanta necessidade aborrecida!
Onde pode acolher-se um fraco humano?
Onde terá segura a curta vida?
Que não se arme e se indigne o Céu sereno
Contra um bicho da terra tão pequeno.
-Foi o que falei! Eis um bom exemplo. A pequenez humana
diante da eternidade.
- Esse não é o poema. O poema (e não estou falando de
rima,mas de música), é dano/engano/humano/sereno/pequeno, e também
terra/guerra, ou aborrecida/apercebida/vida. É o tanto/tanta dando ritmo, som
de tambor. É a palavra mar dentro da palavra morte, por sua vez inserida em tormenta (que se reporta a
tanta). É o onde inventando abismos, é o indigne interferindo na cadência do
verso, é o segura/curta, é o som fechado de sereno acompanhado o som aberto de
céu. Isso é o poema. O que está dito é sugerido por essa música que o poeta
compõe como uma sinfonia.
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