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24 de agosto de 2011
O ROLO DA SITUAÇÃO
Nei Duclós
Nem bem a maquiagem para pintar a cara saiu da gaveta e a faxina já deu sinais de cansaço. Era tudo mentira, claro, como diria Tarso de Castro. Base aliada não abre mão do sistema, que garante o acesso indefinido ao butim, da bufunfa desviada desde a merenda escolar municipal até o uso do helicóptero de 16,5 milhões da PM para o lazer. Mas as evidências não desarmam os espíritos aparelhados, contra os quais debato incessantemente no Twitter e Facebook. Vejo também nos blogs cabeças esclarecidas embarcarem na ilusão de que o Planalto estaria refém do esquema que capitaneia. Isso é tão absurdo quanto um unicórnio sendo devorado por borboletas asiáticas. Qual a fonte do rolo da situação?
A fonte dos equívocos é o diagnóstico que se faz da realidade. É a percepção formatada em linguagem que está atravessada por nós sem perspectiva de solução. Isso se reflete em todo o espectro social. Nem sei por onde começar. Podemos pegar o caso dos menores de idade. Para defendê-los, criou-se um estatuto que serve também para proteger o crime, já que o mandiocão de 17 anos, que estupra e mata, é considerado “dimenor” (corruptela de linguagem jurídica que reflete bem a incapacidade de lidar com o problema). E meninos são os aviões do tráfico. Qual o rolo?
A humanidade não nasce inocente, nasce zerada, o que é outra coisa. Se não implantar nela a cultura, brutaliza. Se a lei não pressionar, será criminosa. Crime, em qualquer idade, precisa de punição. Não adianta apenas enxugar gelo e trancafiar os meliantes mirins que aprontam sem parar, como já está acontecendo com gangs de crianças de 10 anos que apavoram hotéis e pedestres e quando presos destroem a delegacia. Precisa enquadrá-los cedo. E isso só pode ser feito por uma rede idônea de autoridades, o que não temos, pois o crime está instalado na cúpula e se dissemina por todo lugar.
Podemos pegar a literatura. A situação é complicada. Toda a pressão exercida pelos autores emergentes (em cada região, milhares de autores) ou marginalizados (em cada geração, milhares de escritores) bate no paredão do cinismo instalado no poder, nos concursos nicados (como todos sabem, principalmente os que envolvem altas granas).
Como há incompetência para conviver com tanto barulho, costuma-se selecionar algumas cabeças coroadas e atribuir a elas tudo o que de importante ou interessante é escrito pela massa de escribas nolimbo. Por isso hoje temos Einstein autor de auto-ajuda, Mario Quintana injustamente sendo alvo de poesia de platitudes e a Clarice Lispector, coitada, assinando tudo que é abobrinha.
A culpa é da internet! dizem os famosos analógicos, os que não suportam a concorrência de milhões de novos escribas que a cada segundo emitem suas obras. O que era dito antigamente como pose – aquele tom democrático dos falsos gênios que falavam “ora, sou apenas uma pessoa comum”, mas ficavam sentados no trono - hoje é uma realidade incômoda para quem quer disputar lugares bem fornidos, como academias, diretorias, exílios dourados, aposentadorias régias etc.
Na política temos uma ditadura civil mascarada de democracia, como canso de falar há anos por aqui, uma evidência que cada vez mais é provada pelos fatos. O rolo da situação atingiu todas as instituições, já que a condenada, juridicamente, distribuição de dinheiro público para comprar votos no Congresso, o mensalão velho de guerra, prescreve nas fuças da nação indignada. Enquanto isso, continua a terceirização de responsabilidades para o eleitor acossado, que não tem opção senão as vetustas raposas, os burocratas novidadeiros, os palhaços introduzidos nas campanhas por dinheiro farto etc.
O que você fizer em qualquer nível de vida social terá sempre pela frente a negociata, o acordo pífio, a imposição bruta. Não há margem para a inteligência. Esta, só tem uma saída: desmascarar o discurso que segura as pontas da canalha, para criar condições de uma ação mais efetiva, que não caia na esparrela das caras pintadas ou das fichas limpas (que só servem para limpar a ficha dos fichas sujas). Convencer quem está envolvido por ela que o buraco é bem mais embaixo. Argumentar sem emitir “opinião”, já que não implica voluntarismo do pensamento e sim lógica e transparência, para usar uma palavra contaminada.
O discurso fajuto toma conta do sistema corporativo, todo ele envolvido pela especulação financeira, a entrega da soberania à China,o arrocho tributário, a exportação de proteínas e de recursos naturais, um regime que gera bilionários e miseráveis, enquanto as casinhas dos pombais da ditadura de sempre proliferam enriquecendo tubarões imobiliários e aimenta o discurso oficial, que se manifesta por campanhas publicitárias milionárias. Bandidos atacam postos policiais e estes fecham. Qual a solução encontrada? Propaganda cara mostrando montes de policiais fazendo continência.
É porque o discurso decide a parada, a formatação do imaginário é quem tem a chave da cadeia. Precisamos achar o segredo desse mecanismo e escancarar as portas para a liberdade.
RETORNO - Imagem desta edição: tirei daqui.
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