6 de fevereiro de 2010

ALMOÇO DE NEGÓCIOS


Gostaria de saber exatamente o que significa almoço de negócios. Cortam o bife enquanto assinam um contrato? Borrifam a salada com mais valia? Fecham parcerias ao forno? Combinam lucros para a sobremesa? Tomam sopa de dividendos? Como nunca participo de negócios, sempre imaginei um ambiente apropriado para isso, escritórios, salas confortáveis onde servem cafezinhos, mas jamais um almoço, que exige dedicação exclusiva. Você não pode descontar uma promissória no rodízio, bem no intervalo entre o coração assado de frango e a lingüicinha.

Imagino que num almoço de negócios alguém acaba sendo devorado. Talvez o laranja que topou investir sua poupança na corporação dos rottweilers. É o banana que chega depois do aperitivo, em que todos estão prontos para recebê-lo às gargalhadas, mas silenciosos. É fácil enganar um mazanza, basta dizer que a loura do lado está dado mole para ele. O cara é do tempo em que as mulheres davam mole.

Mas o verdadeiro almoço de negócios deve ser entre os craques do ramo. O advogado mil folhas, capaz de qualquer coisa; o empresarião tonel de banha, já no milésimo empreendimento fracassado, mas com casa na Alta Baviera; o executivo farofino, esguio como uma garrafa importada de azeite de oliva, que costuma humilhar os presentes com seus conhecimento culinários/culturais (é autor de um rocambole de rúcula com pimenta de arrepiar).

Esse tipo de participante já deixou tudo amarrado antes do almoço, que é apenas um joguinho perverso para ver quem pagará a conta. Eles escolhem os restaurantes mais absurdamente caros, pedem os pratos que só podem ser pagos com sacolas roubadas do Banco Central, e na hora da conta inventam os expedientes mais marotos, O problema é a falta de imaginação: o empresarião sempre levanta para ir ao banheiro, o farofino fica lixando as unhas, o advogado milfolhas mergulha numa montanha de papéis dizendo que vai mudar os termos do acordo, deixando todo mundo ressabiado – é assim, na chantagem, que ele escapa.

Como então eles conseguem enganar o dono do restaurante? Passam um cheque sem fundos? Oferecem ações de firma chinesa na Malásia? Inventa que vão financiar uma filiar em Timor Leste? Não sei, já disse que não entendo de negócios, muito menos de almoço desse ramo. Acho que jamais, nessa ocasião tão complicada, haverá uma florista oferecendo rosas. A catinga exalada pela sacanagem certamente expulsa qualquer resquício de romantismo.

Gostaria que alguém me explicasse. Há cobertura de almoço de negócios? O setorista fica tomando notas enquanto os convivas mastigam? Há entrevista coletiva na hora do licor? Os jornalistas se servem das sobras depois que todos se vão? Distribui-se remédios para a digestão após o ágape? São muitas as perguntas. Acho que só serão respondidas quando me convidarem para um evento desses. Não sei se vou me comportar à altura.

Qual a roupa adequada? Casaco de três botões, ainda se usa isso? Havaianas de grife, ou é muita bandeira? Cabelo lambido para trás? Sapato branco e marrom? Revólver no bolso do casaco? Acho que só uma personal trainer iria me ajudar. “Não use caneta”, ela me dirá, "para não assinar nada. Fique mudo o tempo todo fazendo cara de paisagem. E concorde sempre com o mais rico e poderoso. Se algum subalterno se manifestar na mesa, peça para alcançar o caviar. E ria quando ele alcançar a pimenta malagueta". São conselhos simples, que devem ser acatados. O problema é pagar a personal trainer no caso de nenhum negócio ser fechado. Continuar sem fonte de renda depois de comer ostras com camarão ao rocheford (ou algo assim) é simplesmente um lixo.

RETORNO - Imagem desta edição: Dogdinner, de Cassius Marcellus Coolidge, o maior artista do século 20, segundo Renzo Mora.

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