16 de fevereiro de 2015

TRANSCENDENCE: HAL, DE 2001, VIRA GENTE



Nei Duclós

Stanley Kubrick impera. Ultrapassou os limites da influência. Desdobrou-se infinitamente pela Sétima Arte como tempestade viral. Seus assuntos, cenários, premonições, terrores estão cada vez mais presentes nos filmes que tentam sair da obviedade. Foi assim em Gravity (de Alfonso Cuarón, 2013) e será sempre assim quando o cinema precisa levitar. Em Transcendence (de Wally Pfister, 2014), com roteiro de Jack Paglen, o cientista Will Caster (Johnny Depp) é a evolução do supercomputador HAL, de 2001, para a autoconsciência humana. Não se trata mais da máquina versus gente. Mas de gente que se transforma em máquina para tentar resolver os conflitos da Terra, pagando um alto preço por essa ousadia. A ambição da Inteligência Artificial demonizada pela personalidade do cientista apaixonado rompe a lei e usa o crime da mesma forma que usa as boas intenções.

Precisa ser desligado,como em 2001. No filme de Kubrick, quem faz o serviço numa cena memorável éo astronauta que sobrevive ao assassinato em série promovido pela superinteligência enlouquecida em seu poder. Em Transcendence, é a mulher do cientista que vai inocular um vírus mortal em suas engrenagens. Em ambos os filmes, a pessoa mais próxima é que se encarrega do desfecho  – como nos filmes da máfia, em que o melhor amigo é escolhido para eliminar o escolhido para morrer.

A vítima antes poderosa se esvai aos poucos, Hal recitando uma canção em slow motion e Caster se entregando como um suicida para a mulher que ama, não por acaso chamada Rebecca HALL (Evelyn Caster). Hall era seu álibi: tinha feito tudo em função dos sonhos dela. Na morte, recupera a humanidade para se refugiar num santuário idealizado pela cultura ambientalmente correta.

O cenário de Transcendence é o interior da nave de 2001, com o adendo de que alguns takes reproduzem a viagem psicodélica além de Jupiter, mas de forma estática e não multicolorida, como acontece em Kubrick. Os largos espaços clean, com pessoas futuristas deslizando por ambientes perfeitos são o sonho de 2001 reproduzido na terra e não mais no espaço. Pois no fundo, o planeta faz parte daquela região misteriosa que a nave em direção a Júpiter queria atingir. Acabou cegando aqui mesmo, que é o lugar mais distante que pode existir. “Longe daqui, aqui mesmo”, como diz o título de um livro de Antônio Bivar.

A história tem cenas de guerra, para variar, disparadas de jipes no deserto ala Hatari, de Howard Hawks, e um elenco forte, com coadjuvantes como Paul Bettany ( o cientista Max Waters) Cillian Murphy ( o policial Buchanan), Morgan Freeman (o guru Joseph) e Kate Mara (a neoludista Bree).



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