Nei Duclós
Stanley Kubrick impera. Ultrapassou os limites da
influência. Desdobrou-se infinitamente pela Sétima Arte como tempestade viral. Seus
assuntos, cenários, premonições, terrores estão cada vez mais presentes nos
filmes que tentam sair da obviedade. Foi assim em Gravity (de Alfonso Cuarón,
2013) e será sempre assim quando o cinema precisa levitar. Em Transcendence (de
Wally Pfister, 2014), com roteiro de Jack Paglen, o cientista Will Caster (Johnny
Depp) é a evolução do supercomputador HAL, de 2001, para a autoconsciência
humana. Não se trata mais da máquina versus gente. Mas de gente que se
transforma em máquina para tentar resolver os conflitos da Terra, pagando um
alto preço por essa ousadia. A ambição da Inteligência Artificial demonizada
pela personalidade do cientista apaixonado rompe a lei e usa o crime da mesma
forma que usa as boas intenções.
Precisa ser desligado,como em 2001. No filme de Kubrick,
quem faz o serviço numa cena memorável éo astronauta que sobrevive ao
assassinato em série promovido pela superinteligência enlouquecida em seu
poder. Em Transcendence, é a mulher do cientista que vai inocular um vírus
mortal em suas engrenagens. Em ambos os filmes, a pessoa mais próxima é que se
encarrega do desfecho – como nos filmes
da máfia, em que o melhor amigo é escolhido para eliminar o escolhido para
morrer.
A vítima antes poderosa se esvai aos poucos, Hal recitando
uma canção em slow motion e Caster se entregando como um suicida para a mulher
que ama, não por acaso chamada Rebecca HALL (Evelyn Caster). Hall era seu
álibi: tinha feito tudo em função dos sonhos dela. Na morte, recupera a
humanidade para se refugiar num santuário idealizado pela cultura
ambientalmente correta.
O cenário de Transcendence é o interior da nave de 2001, com
o adendo de que alguns takes reproduzem a viagem psicodélica além de Jupiter,
mas de forma estática e não multicolorida, como acontece em Kubrick. Os largos
espaços clean, com pessoas futuristas deslizando por ambientes perfeitos são o
sonho de 2001 reproduzido na terra e não mais no espaço. Pois no fundo, o
planeta faz parte daquela região misteriosa que a nave em direção a Júpiter
queria atingir. Acabou cegando aqui mesmo, que é o lugar mais distante que pode
existir. “Longe daqui, aqui mesmo”, como diz o título de um livro de Antônio
Bivar.
A história tem cenas de guerra, para variar, disparadas de
jipes no deserto ala Hatari, de Howard Hawks, e um elenco forte, com
coadjuvantes como Paul Bettany ( o cientista Max Waters) Cillian Murphy ( o
policial Buchanan), Morgan Freeman (o guru Joseph) e Kate Mara (a neoludista Bree).
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