Nei Duclós
Não durma ainda. Lembrei onde coloquei as estrelas.
Amor. Fazia tempo que eu não lembrava essa palavra. E você, que a pronuncia
sendo o que é, ficou esperando que eu dissesse.
Certo, o poema não era grande coisa. É que perto de ti, tudo some.
Lua Nova finíssima, barra do teu vestido, sorriso que nos traz do fundo
algum estímulo e nos leva pela mão até a noite infinita.
Agora vamos ao que interessa. Acorde respirando perto e pergunte onde
estamos, olhando pela janela de Toscana
Águas do rio molham teus pés. Meu verso, o resto.
Pulei o momento dos versos. Fui parar no exílio, onde não te encontras.
Voltei e estavas escondida. Precisei esperar o fim do esconderijo.
Não há beleza se não molhas a terra onde a semente aguarda teu toque
decisivo.
Dizes mas não me deixas ouvir. Guardas, delícia.
Olhas de lado para o Tempo, que se esconde, mas contigo se entrega, como
alguém que ama de longe.
Não deixo pontas soltas. Te amarro em meu cordão de sonho.
Já fiz a auditoria. Não descobri nada, mas valeu passar teus movimentos em
revista.
Tão bonita, enche os olhos do príncipe, de cristal na mão, teu íntimo
querer.
É cedo e estamos longe do domingo. Foi o que aconteceu com a Criação no
meio do caminho. Era preciso respirar fundo quando tudo parecia sem sentido.
GELO
Vou devolver intacto o gelo que me deste. Verás como é bom sofrer no
freezer.
Emudeça, arrependida. Tenho o que fazer na oficina. Há poemas que estão
prontos, falata apenas teu espírito.
Vá para o rio, sou o crepúsculo ao meio dia. Rede de pesca em leito seco.
Espinhel de epifania.
Pensas que estás a salvo tapando os ouvidos. Minha voz faz parte da pele,
como o arrepio.
Que adianta o calor se jogas água fria? És véspera de ciclone sem
serventia.
Não se preocupe, não estou sofrendo. Estou off line, entenda.
Falas por monossílabas tua enciclopédia faminta
É uma pena que não saibas o quanto tens de bela. Mas me conformo, sou um
admirador no exílio.
Não me diga coisas usando meus versos. Costure sua fala nos lábios de
delícia.
Faça o seguinte: conte até vinte. Depois aguarde, sentada, o meu convite.
Sei que não resistes. Mas agora é tarde. Cansei da água fria.
POSE
Passado um tempo, a pose feita para a foto vira tua essência.Era apenas uma
representação de ti mesmo, que substitui o que perdes para sempre.
Curto tua imagem porque me dá na telha. Porque acho o máximo. Para que a
bruta sinceridade te homenageie.
Tão linda que dá remorso por não tê-la conhecido antes.
Já vai alto o dia. Feliz por ficar distante, peregrina?
Mostraram um caminho que não existia. Sorte que o coração ilumina a trilha
que inventamos ao longo da vida
Manchas solares são raios de Zeus na terra absurda. Ira contra Juno e os
decadentes heróis da lenda.
RETORNO – Imagem desta edição: Louise Bourgoin.