27 de maio de 2020

AS TIMING GOES BY

Nei Duclós


No final da leitura de Casablanca - A criação de uma obra-prima involuntária do cinema (Estronho, 128 pgs.) - noto que o autor, Renzo Mora,  encerra sua obra como Ricky (Humphrey Bogart) se despede de Ilsa (Ingrid Bergman): de maneira lúcida, determinada e amorosamente amarga. Pois Renzo, como Bogart, é o que dizia Jack Hawkins sobre Peter O'Toole em Lord Jim, de Richard Brooks: um dos nossos.

A força e a coragem de Ricky segura o filme, que é uma confluência de motivos para um fracasso, mas que a soma de talentos envolvidos e de personalidades que servem de bagagem aos protagonistas contribuem para o mais amado filme  da História do cinema.

Também como Ricky , Renzo tem a grandeza de servir de âncora para resgatar os detalhes minuciosamente pesquisados e que nos são dados de bandeja,  e, como um autor honrado, abre mão da prenda maior, o crédito. Parece que tudo foi dito, já que o livro elenca inúmeros trechos de escritores, ensaístas e memorialistas célebres. Mas Renzo se reserva o principal.

Primeiro, a importância do timing, que tanto na sucessão de capítulos quanto das cenas e personalidades na frente e atrás das lentes, obedece à sedução do suspense. Segundo, sua quase imperceptível contribuição para a originalidade da montagem que faz do livro - o que torna esta obra escrita amada e sedutora. Ela  foi entregue a nós, leitores, beneficiados pelo desprendimento do herói que fazia tudo errado e num lance definitivo decide a parada.
E, o mais importante: a transcendência do pacote todo em que o Acaso, esse deus laico muito considerado pelo agnóstico Renzo, se impõe como um raio de luz não previsto, mas real.

A não ser que Deus exista e seja escritor - e escreva sobre cinema.
Nei Duclós 

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