19 de setembro de 2013

TOCAR O SILÊNCIO



Nei Duclós

Tocar o silêncio como um instrumento. Afinado no diapasão do poema.

Tua inteligência me comove. Minha emoção te desafia.

O que é humano contradiz o olhar tolhido pela mesmice. A criatura amarga e bruta recria para navegar doçura. Há luz na ruptura, no risco.

Use proparoxítona se quiser ser contundente (ótima), paroxítona quando deve ser objetivo (estoque) e oxítona se precisar ser doce (luar)

Depois de passar a vida toda aprendendo, você esquece. Aí aprende que não há mais tempo.

Ilha chuvosa e fria, quando ficará firme a promessa da primavera? Reprove o inverno por insuficiência meritória.

Agora a noite cai como chuva de meteoros. A chuva pressiona até o último alento. Nossas mãos se procuram, náufragos recentes.

Tenho para mim o que não me pertence. Está contigo, coração ameno.

Jogo pesado porque não há outro termo. Reparta o que desisti de ser medo.

Sermos distantes é o destino que definiram para nossos corpos ausentes. Pule do barco, nadadora de extremos.

Inauguro a invasão da tua presença no território neutro de um torto setembro. Floresce o que demora, tua certeza apesar dos erros.

Deixei para depois e o depois não veio. Escrevo agora para que haja tempo.

Repito porque esqueci alguma coisa no tempo perdido.

O eco é um espírito, uma assombração do teu grito.

Ganho o dia quando você curte. Carícia escassa, mas profunda, fonte da fantasia.

Faz tempo, nem me dei conta. Os anos se passaram, como se dizia de quem abusava da confiança.

Doce, amargo, frio, quente, contente, triste: desvencilhar o amor do que é supérfluo para que reste o perfil misterioso do sonho, criatura de luz intensa que expulsa a morte dos olhos.

Fuja, gentil promessa, doce medrosa. Fica para a próxima, quando houver surpresa mais uma vez.


RETORNO -  Imagem: foto de Eliane Fogel.