Nei Duclós
Viajas por mim com teu perfume.
Soltas o pó de fada em meu convite. Dizes sim sem dizer nada.
Passei o dia contigo. Lembrar-te é o
meu abrigo.
Já se foi o tempo. O dia sumiu no
ralo, deixou de fora os cabelos, nosso balanço do efêmero.
Não tenha medo, o terreno é firme.
Só existe nós, universo oculto.
Te mostras fora de foco. Te guardas
sob a neblina. O meu olhar se embacia. Vibro com tua chuva.
Me tiras o ar para me deixar no
vácuo, onde perco o contato com as leis físicas e matemáticas.
Penso em ti, mas faz de conta que
estou ocupado. Quem me vê acha que despacho. Mas sou ministro sem pasta diante
de ti, beldade.
Viajaste para o Oriente. Me
trouxeste um presente. Tu mesma, glória da vida
Querida
que silencia. Cultivas meu sonho oculto. Somos nossa fantasia
Tão pertinha me enchia de mimos.
Éramos tão separados. Mas ficou o visgo.
Literatura não faz parte do rodízio.
Situa-se onde não fica. Num outro mundo, sob camadas de espelho.
Cada vez que te escuto minhas
florestas se agitam.
Complica o verbo sem rumo, esperto
nos seus estudos, aprende quando desiste, ensina se estiver pronto.
A noite leva para lugar nenhum, a
não ser que o acaso te ponha em meu caminho.
Pulei em ti quando menos esperavas. Estavas
distraída com a mesmice dos encontros.
Hora do êxtase. Solte os cachorros.
Vênus agora sozinha curte a solidão
do seu brilho no horizonte da noite fria.
Estás perdida. Achei o que
procuravas.
Falo por cartazes antigos,
rabiscados de versos livres. Às vezes uma palavra cruza uma paisagem que já não
existe. E retorna nas mãos de uma surpresa.
Uma hora alguém derrapa na curva.
Cai no agito que vira sossego. Mergulho de peito.
Esse grude que dura o tempo todo e
volta cheio de calor. Nem sabemos do que se trata, mas é bom.
A tarde voou, no piso liso do tempo.
Escorregamos para a noite, com seu vórtice de assombros.
Deus fez o homem do barro e lhe
soprou uma alma imortal, a mulher.
Somos como o crepúsculo. Dia e noite
quase se tocando.
Tinha esquecido de ser mulher, ela
disse. Tua palavra faz misérias comigo. Sei que é sem querer, bandido.
Estás além da minha fantasia. Por
mais que eu te invente, voas soberana.
Fazemos tudo ao contrário. Nos
submetemos na política e nos revoltamos no amor.
Pouso é compromisso do voo quando
decola.
Mulher é que gosta de poesia, disse
o machão. Por isso mesmo, disse o poeta.
Deixamos para mais tarde o que nos
desperta cedo.
Tenho um coração criminoso, uma
psicopatia amorosa: te quero de todas as formas, floração da serra.