18 de julho de 2013

PLUMA DE PÉTALA



Nei Duclós

Pluma de pétala, roçar de penugem, bóia no éter, louça de estrela: flutuas no beijo que componho.

Nada mudou, a não ser teu rosto crispado de amor diante do segredo que enfim nossos corpos revelaram.

Fico esperando que me fales no ouvido. Mas só escuto o mar, minha solidão ao vivo

Quando nos sintonizamos, na conexão funda, andar depois fica difícil.

Acordei com a palavra fazendo café. Cheiro de você rompendo o cerco do inverno.

Desconfias que fiz a esmo os versos que cultivo. Sou lavrador de sentimentos, flor púrpura.

Amanhecemos num terraço avulso. Próximos de um desatino, um beijo desencadeando chuva.

Dê uma volta para eu ver você em seu vestido. Depois desfaça em parafuso como se fosse uma valsa.

Amor é invasivo. Paradoxo de algo que depende de mútuo acordo.

Querer é livre. Chegar mais perto desde que consintas.

Você tão parecida com aquela estrela longínqua. Com a diferença que és minha

Já faz uma cara que pediste um tempo. Fico irreconhecível sem teu espaço.

Saudade é um elástico que te traz de volta em poucas horas.

Nunca estive perto de você, mas já estive mais perto.

Estou cada vez mais longe, olhos de violeta.

Só vou se me chamar. Senão volto para o mar.

Poesia é assombro. Por isso beijo teu ombro

É amor? perguntou-se.
Era.


EXISTIR-ME

A moeda brasileira é dívida. Sempre fui rico.

Tudo me inviabiliza. Construí um mundo à parte, onde possa existir-me.

A noite é quando o dia pensa.

O amanhecer é imaginado pela noite alta.

Do mundo bruto, temos a manha: aceitamos que seja real, desde que ceda depois da curva

Ficamos cada um numa ilha. Formamos um arquipélago de suspiros.

Fantasia, território livre, onde estabelecemos acordos inverossímeis. Maná que alimenta vigílias.

Não fosse o sol, estaríamos fritos.

Estamos de férias. Imaginamos uma viagem em cada esquina. Espere o sol, que vem de carruagem.

Daqui a pouco tudo passa: o frio, a madrugada, a saudade.

Isso não faz sentido, mas podemos imaginá-lo

Pense num diálogo. Sou o que te responde.

É simples. Basta impregnar a palavra com o que ela sonha.


RETORNO - Imagem desta edição: Nastassia Kinsky.