Na Universidade Federal de Santa Catarina, Miguel Lobato Duclós (1978-2015) cursou um
ano de Letras, onde desenvolveu alguns trabalhos sobre literatura. O pensador
aborda o gênero conto com a profundidade que trouxe de sua formação filosófica,
uma superposição conceitural com grande poder de síntese. Um aspecto precioso
do seu texto é a luz que lança sobre os mecanismos usados na sua análise, numa
permanente revelação de como engendra pensamento a partir de vários autores e
recursos teóricos.
“O CONTO: DIFICULDADE DE DEFINIÇÃO DO GÊNERO
E ABORDAGEM DE ALGUNS TEÓRICOS.”
Miguel Duclós
Originalmente apresentado no CCE/UFSC
Seminário escrito baseado na leitura do texto “O conto: uma
narrativa”, capítulo 2. do livro Teoria do Conto de Nádia Gotlib.
“ O conto é notoriamente um gênero literário de difícil
definição, e as teorizações por parte de escritores e críticos acerca desse
tema atingem grande número e diferentes graus de complexidade, principalmente
se considerarmos o problema em diferentes contextos – a evolução da concepção
do conto no tempo e nas diferentes culturas e países, por exemplo.
Qualquer tentativa de abordar a questão, portanto, poderá
fracassar se não considerar a diversidade e as diferentes possibilidades de
abordar a problemática. Esta abordagem é não raro feita de forma pessoal e
autoral, e talvez por isso parcial ou idissiocrática, e isto nos traz algumas
frases bem humoradas, como a do escritor paulista Mário de Andrade, que afirmou
"conto é tudo aquilo que o autor quiser chamar de conto"[1]. O escritor
argentino Júlio Cortázar, porém, adota uma abordagem mais cautelosa já no
título de seu escrito “Alguns aspectos do conto”, onde afirma:
“É preciso chegar à idéia viva do que é o conto, e isso é
sempre difícil na medida em que as idéias tendem ao abstrato, a desvitalizar
seu conteúdo, ao passo que a vida rejeita angustiada o laço que a conceituação
quer lhe colocar para fixá-la e categorizá-la. Mas, se não possuirmos uma idéia
viva do que é o conto, teremos perdido nosso tempo, pois um conto, em última
instância, se desloca no plano humano em que a vida e a expressão escrita dessa
vida travam uma batalha fraternal, se me permitem o termo; e o resultado desta
batalha é o próprio conto, uma síntese viva e ao mesmo tempo uma vida
sintetizada, algo como o tremor de água dentro de um cristal, a fugacidade numa
permanência.” [2]
A questão da definição do conto como gênero literário passa
ainda pela própria evolução da forma de narrar que o gênero sofreu. Nosso
objetivo neste trabalho limita-se somente a apontar a dificuldade desta
definição – e não tentar abarcar o problema em uma visão geral. Alguns
subterfúgios podem ser úteis para trafegarmos por esta via de difícil acesso.
Um deles é o de perseguir a perspectiva dos grandes autores que, como afirmamos,
não raro fizeram reflexões e assertivas sobre suas obras e o caráter geral do
gênero conto. Nesse escrito de Cortázar, por exemplo, é ele próprio quem, a
partir de sua experiência como contista, postula alguns princípios que julga
como fundamentais para a configuração do conto como gênero literário. Apesar
desta perspectiva que parte de uma experiência particular, Cortázar preocupa-se
em destacar os aspectos constantes que caracterizam o gênero na sua
manifestação realizada por diversos autores. Notável é a influência do poeta e
contista estadunidense Edgar Allan Poe (1809-1849) na literatura de Cortázar, e
isto é um indicativo de como a presença da produção literária de grandes
autores, como Poe, Tchecov, Tolstói, Guy de Maupassant, Voltaire etc., ajudou a
fixar o gênero literário conto na sua forma contemporânea e em diferentes
correntes. [3]” (Miguel Lobato Duclós, continua no link)
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