Nei Duclós
Poetas
não deveriam falar nada
para não
afastar as gentes dos seus versos
Suas
posições políticas, implicâncias
as
desavenças e lembranças
tudo isso
deveria ficar silente
para que
o poema exista sem interferência
Calar-se
diante do mundo, já que poesia
é o
excesso, está tudo dito
com a
vantagem que há pudor na arte
onde não
se confessa de maneira explícita
senão a
estrofe perde a compostura
e tudo
pode virar conversa de comadre
Se bem
que havia poesia nas antigas comadres
de nomes
como Tita, Brígida, Diusinda
falavam
pouco, ao contrário da lenda
quem fala
pelos cotovelos não tem parentesco
nem
limites, diz o que bem entende
enquanto
há sempre sobriedade nos vínculos
Em
cadeiras de balanço, as comadres falavam baixo
Um
casamento próximo, uma receita, a morte
rondando
a porta, o tempo que não acaba
É como
deve ser o poema, ligado por obra do batismo
ao que
lê, como numa sessão de conversa à tarde
quando há
mistério provocado pelos pregões da rua
As
antigas senhoras, como a poesia, escutam, sérias
por trás
de lentes garrafais, em minucioso colóquio
escasso
de informações que poderiam sobrar
pois tudo
já se sabe de antemão, é só um convívio
a humana
comunhão para mitigar a solidão eterna
Deus
gosta quando o único ruído é a letra rabiscada
RETORNO - Imagem desta edição: obra de Edward Hopper.
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