22 de agosto de 2015

POR QUE A ALEMANHA É O BERÇO DA ECOLOGIA?



Nei Duclós

Fiz uma proveitosa consulta a trechos do livro “Ecology,Economy and State Formation in Early Modern Germany” , de Paul Warde (Cambridge University Press, 2006), que lança luzes sobre os motivos de a Alemanha ser o berço da ecologia. Tem a ver com a cultura alemã formatada por camponeses no século XIII e que permaneceu intacta por 600 anos, até o século XIX.


Que cultura era essa? Uma sólida estrutura econômica  fundada na relação regrada com os recursos ambientais. Quem vive no campo sabe: é preciso diminuir ao máximo os riscos para a produção, as interferências do clima, as possibilidades de escassez seguidas de fartura. Para que haja um mínimo de prejuízo, deve se estabelecer uma conduta coletiva que afaste as ameaças para uma distância segura. Isso significa agir em comum acordo com a vizinhança para preservar de maneira sustentável os recursos naturais, especialmente a madeira, base energética que perdurou séculos antes que as inovações tecnológicas liberassem o carvão mineral para mover as novas indústrias.

Na Alemanha profunda, o estado unificado surgiu nesse ambiente de preservação. O conglomerado de aldeias e distritos que conviviam em territórios em disputa estabelecia limites. Se, por exemplo, a minha árvore faz sombra para a sua grama, prejudicando a alimentação do seu gado,  é justo que você usufrua de uma parte da produção da minha árvore. O corte da madeira precisa ter fiscalização rigorosa para que se mantenha a principal fonte de sustento de uma economia de subsistência.

Para tanto, era preciso guardas que mantinham atento controle do uso dos recursos naturais. Nem sempre com sucesso, pois os habitantes transgrediam as regras em favor dos seus interesses e era preciso enquadrá-los para garantir a subsistência de todos. A madeira acumulada em depósitos ou as casas feitas das árvores precisavam por exemplo, ter demarcações seguras para evitar incêndios, uma providência aprendida na prática

Esse sistema gerou a estrutura do estado nacional, que nos primórdios ainda estava às voltas como uma série de heranças da tradição mística. Os médiuns que viam fantasmas e anunciavam suas profecias eram enquadrados como um fator de desequilíbrio social, pois poderiam prever catástrofes colocando em pânico uma população amarrada a crendices. Os místicos eram igualmente monitorados como qualquer criador de gado ou plantador de grãos. A relação religiosa com a natureza e seus poderes sobrenaturais, que povoava a imaginação coletiva, duelava com a lógica racionalista que no século 19, época em que foi criado conceito da ecologia, ganhou grande impulso com as descobertas científicas.

A revolução industrial, de origem britânica e que usava o carvão mineral, se opunha a esse sistema secular alemão da tradição de respeito ao ambiente em favor da sobrevivência não apenas das comunidades, mas da nação. Era questão de honra cercar a defesa ambiental de todo o aparato legal possível para não ser desmoralizada pelo iluminismo francês ou o pragmatismo britânico. O comportamento, a tradição, os hábitos familiares, tudo ficou tomado por esse sistema que garantia a vida. O romantismo alemão surge assim como um fator de resistência, acrescido de uma forte tradição religiosa, pelo peso do misticismo ancestral, o enraizamento dos costumes e o isolamento natural de uma sociedade que precisava se preservar da invasão dos forasteiros.

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